Lula visita centro de formação do Senai em Luanda

04/11/2003 - 18h16

Spensy Pimentel

Luanda (Angola) - O ex-torneiro mecânico formado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva visitou na manhã de hoje, nesta capital, um projeto brasileiro que está dando a jovens de um país que acabou de sair de 40 anos de guerra a oportunidade de mudar de vida. E segundo Lula, o Senai fez sua vida "mudar da água para o vinho". O evento marcou o encerramento da programação do presidente brasileiro em Angola. De lá, ele seguiu para Moçambique, o terceiro dos cinco países africanos que visita até sábado.

O Centro de Formação Profissional do Cazenga, bairro pobre na periferia de Luanda, qualifica, desde 1998, a cada semestre, 1.000 jovens angolanos para exercer profissões em ramos como a construção civil, corte e costura, manutenção de eletrodomésticos e mecânica diesel. Trata-se do maior projeto brasileiro de cooperação internacional, e o Senai já investiu ali US$ 4 milhões.

Na entrada do centro, o presidente foi surpreendido com a exposição, num mural, de uma foto sua, aos 15 anos, quando já aprendia uma profissão no curso do Senai. Ele falou do sentido que essa experiência teve em sua vida. "O Senai foi a porta de tudo o que aconteceu comigo, porque, se eu não tivesse aprendido uma profissão, não estaria agora falando com vocês. Foi o melhor momento da minha adolescência, porque, a partir dali a minha vida mudou. Esta é a verdade.
Depois que eu aprendi uma profissão, consegui o que muitos jovens não conseguem", afirmou Lula.

Segundo o presidente, "o menino ou a menina que tiver acesso a uma escola como esta, e se puder ter uma formação profissional, a sua vida vai mudar e vai poder escolher, num país em desenvolvimento como este, um local de trabalho, vai ter mais chances para
trabalhar, vai poder melhorar o seu salário".

Lula acrescentou que o jovem formado numa profissão dá o primeiro passo para conquistar a sua cidadania plena.

A guerra civil veio logo em seguida da conquista da independência da metrópole portuguesa, e Angola não teve tempo para cuidar da educação. O gasto com as forças armadas consumia quase um terço do orçamento público. E o país permanece até hoje com mais da metade de sua população analfabeta. Sem falar na área técnica. Mesmo para tarefas simples falta mão de obra
e estrutura. Até as tábuas em que os alunos praticam marcenaria no Cazenga, por exemplo, são importadas, porque praticamente não há serrarias no país. "A mão de obra estrangeira custa caro e não fica no país", informou a coordenadora-geral da Agência Brasileira de Cooperação, Alice de Abreu, para explicar a importância da ação brasileira nesse campo.

Hoje em Angola há mais de uma geração inteira a educar. E os brasileiros, com sua proximidade
lingüística e cultural, já estão engajados nessa tarefa. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o país é hoje o principal beneficiário dos programas de cooperação técnica desenvolvidos pelo Brasil em nações em desenvolvimento.

Desde 2002, o governo brasileiro passou a apoiar o programa angolano "Escola para Todos", que planeja resolver o problema da educação no país, nos próximos anos. Para o ministro Celso Amorim, a cooperação, neste caso, pode até mesmo ir além: "Cooperação se combina com negócios. A perspectiva de ampliação desse programa pode fazer atingirmos uma escala de negócio", disse ele na segunda-feira. O ministro explicou que, no futuro, empresas que se dediquem à formação de professores e alunos angolanos podem receber auxílio na forma de financiamento.

A lista dos acordos assinados ontem entre os dois países dá uma boa idéia do tipo de contribuição que o Brasil pode oferecer. Agronomia, veterinária, extensão rural, agricultura familiar, educação ambiental, engenharia do petróleo, desenvolvimento urbano e administração pública são alguns dos temas. "Como o Brasil não pode ser competitivo em recursos
financeiros, como a Alemanha ou o Japão, entramos dessa forma na cooperação", disse Alice de Abreu.

O investimento privado também deve ter seu papel nessa colaboração. A maior universidade particular brasileira já enviou este ano uma missão com a finalidade de prospectar mercado em Angola. E empresas com atuação no país mantêm convênios voltados para o campo da educação. A Petrobras, por exemplo, tem parceria com sua congênere, a Sonangol, e o Ministério
dos Petróleos. Forma anualmente centenas de trabalhadores e colabora no envio de estudantes para intercâmbio em universidades brasileiras. Em doações para escolas, creches, hospitais e comunidades rurais, a empresa investe cerca de US$ 800 mil anuais. A construtora Norberto Odebrecht ocupa hoje pelo menos 24 ex-alunos do Cazenga.