Resultados da Bovespa são sinais de retomada da economia, afirmam especialistas

09/10/2003 - 10h41

São Paulo, 09/10/2003 (Agência Brasil - ABr) - Nas últimas semanas, os bons resultados da Bovespa tem ganhado os noticiários. Dia após dia, o movimento de negócios bate recorde. Simultaneamente o dólar vem caindo e o risco-país - reflexo da expectativa dos investidores internacionais na economia brasileira - despenca. Nessa quarta-feira apresentou o melhor patamar desde 1998 - 616 pontos. O principal título da dívida pública brasileira, o C-Bond, também se valorizou. Esse quadro seria reflexo da retomada de confiança na economia brasileira e indícios de bonança pela frente?

O vice-presidente do Instituto Brasileiro dos Executivos de Finanças (Ibef), Keyler Rocha, disse que esses resultados da bolsa antecipam os efeitos macroeconômicos por meio das ações, isto é, títulos negociados. Acredita que, nesse ritmo, há condições para que as atividades empresariais se beneficiem ainda este ano. "O quadro que era bastante preocupante no final do ano passado melhorou consideralvelmente". Ressalta, também, que a queda do dólar não prejudicará as exportações brasileiras, uma vez que os exportadores trabalham com uma certa margem de flutuação. "Então qualquer patamar entre R$ 2,80 e R$3,00 é administrável".

O professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e um dos principais elaboradores do programa de governo do PT, Luiz Gonzaga Belluzo, diz que os números da Bovespa refletem aspectos externos e internos de momento. Lembra que, no ano passado, por exemplo, chegou a se pensar que o país estava à beira de um choque econômico, tese que foi refutada ao longo dos meses. O economista sugere que o país, aproveita este instante, para comprar mais reservas e, com isso, a moeda brasileira não se valorize demasiadamente. Não aposta em taxas boas de crescimento já em 2003. "Seria preciso que a produção industrial começasse a crescer a taxas muito elevadas como, por exemplo, 8% ou 9%. Eu acho que isso é improvável", ponderou.

O risco país, segundo Belluzo, "reflete o estado de espírito dos mercados de maior confiança na economia brasileira". Ele lembrou que o país nunca atingiu risco tão baixo desde a crise asiática. "Estamos ficando abaixo dos 700 pontos, o que é bom para o Brasil, mas é preciso ter claro de que isso não é uma bênção definitiva que afirma a superação da situação de vulnerabilidade externa da economia. Ainda temos muito chão para andar. Não podemos deixar que essa melhoria nos iluda, nos deixe imaginar que estamos no melhor dos mundos", alertou.

O presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo e da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), Synésio Batista da Costa, discorda de previsões sobre crescimento econômico para este ano. "Não deixemos que essa ilusão nasça nas nossas cabeças. Isto não é possível", disse, acrescentando que "vamos viver uma bolha de consumo em outubro, novembro e dezembro porque 10 milhões de brasileiros, que tinham o nome sujo, vão poder comprar e eles são excelentes compradores". Lembrou que, por outro lado, o décimo-terceiro salário, os empréstimos consignados em folha de pagamento e o pagamento das diferenças dos planos Collor e Verão sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) devem provocar aumento no consumo e esgotar os estoques, fazendo com que a indústria afaste a possibilidade de demissões.

Batista acrescentou que todos os dados do mercado financeiro são um claro sinal ao Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) de que há condições de reduzir a taxa básica de juros (Selic). "O Copom tem todos os sinais para reduzir (a Selic): não há ameaça de espiral inflacionária, os investimentos estão acontecendo, há tranqüilidade no mercado e nenhuma catástrofe prevista pelo Copom aconteceu", disse.

O professor do Ibmec e ex-diretor do Banco Central, Carlos Tadeu de Freitas, atribuiu a boa saúde do mercado financeiro ao esforço do governo em realizar as reformas tributária e previdenciária, gerar superávit fiscal e reduzir as taxas inflacionárias. "Era esperado que o mercado fosse reagir favoravelmente", disse. Segundo ele, o desempenho da Bolsa de Valores está indo "um pouco além daquilo que seria normal" e é uma reação às quedas anteriores e aos investimentos estrangeiros no mercado de valores, incentivados pelas taxas de juros altas. Segundo ele, a entrada de dólares no país está sendo excessiva e é preciso que o Banco Central fique atento a isso. "É importante que o Banco Central comece a acumular reservas, porque isso não vai durar muito tempo", observou.

Para Freitas a boa situação do mercado financeiro do Brasil vai depender dos Estados Unidos. "As taxas de juros lá estão tão baixas, com taxas de juros reais negativas, que o dinheiro lá queima na mão das pessoas", disse. Segundo ele, é preferível para os investidores apostarem no Brasil, que tem taxas de juros e mercado de ações atraentes. "Eu acho que isso aí é momentâneo, não vai durar muito tempo. Pode ser que dure, mas não nesse ritmo que está aí", observou.t

Freitas acredita em uma boa situação até o final do ano e crescimento econômico no próximo, a não ser que aconteça algum problema externo que provoque elevação dos juros e fuga de dólares. "No frigir dos ovos, para os próximos meses e para o próximo ano, a situação é bastante favorável", disse, acrescentando que "se não acontecer nenhuma crise externa desse tipo, o país vai crescer em uma faixa de 3% a 3,5%, porque a base este ano é muito fraca", disse.

Para Anderson de Oliveira Taquebaiashi, da Lira Corretora de Câmbio, o excelente desempenho da Bolsa de Valores está refletindo fortemente no câmbio. "Muito capital estrangeiro vem entrando, como investimento, no país, e isso torna o fluxo bem mais positivo nos últimos tempos, fazendo com que o dólar tenha essa queda acentuada nos últimos dias", disse. Taquebaiashi observou, entretanto, que "não seria bom para o país deixar com que essa desvalorização (do dólar) se estenda". Ele acrescentou que há uma expectativa muito grande em relação a uma reclassificação do Brasil pelas agências de rating.