Governo quer ampliar uso de ''softwares livres'' para economizar

04/10/2003 - 10h08

Repórter da Agência Brasil
Gustavo Bernardes

Brasília - O governo federal, com o objetivo de cortar custos, começou a colocar em prática uma nova estratégia: trocar aos poucos as licenças pagas a poderosas companhias, como Macromedia, Adobe e a conhecida Microsoft – empresa de software detentora de mais de 90% do mercado mundial – pelos chamados "softwares livres", sistemas operacionais que não exigem o pagamento de licenças e podem ser distribuídos e alterados gratuitamente por qualquer indivíduo.

Na linguagem de quem não lida diariamente com informática, é como se o governo federal eliminasse completamente o Windows de todos os computadores públicos para implantar sistemas mais baratos e flexíveis semelhantes ao Linux – o software livre mais eficiente e popular do planeta. Os técnicos que conhecem bem o setor garantem que a diferença de qualidade entre os dois sistemas é brutal. "Como o próprio nome diz, posso usar o software livre como quiser. Posso copiar, distribuir e modificar sem estar cometendo qualquer ilegalidade. Já no caso do outro sistema eu tenho uma série de restrições", explicou o funcionário público, Carlos Secconi, atuante no setor de tecnologia há cerca de 15 anos.

Segundo ele, a adoção do novo sistema evita que usuários se tornem "reféns" de programas de softwares ou aplicativos limitados, cujos códigos são fechados de forma a evitar alterações, melhorias ou cópias. "Se o Brasil adotar este paradigma de vez podemos dar um salto muito grande, já que temos gênios nessa área e uma comunidade tecnológica no país cada vez mais respeitada", disse Sérgio Amadeu da Silveira, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) e um dos responsáveis por implantar o software livre no governo. Segundo ele, as licenças que estão vencendo não serão renovadas para que a migração dos softwares comece a ser feita em larga escala.

Reduzir custos e aumentar investimentos

Mas não é somente a flexibilidade e a democratização do novo sistema que vem fascinando os funcionários do governo que trabalham com tecnologia. O custo zero com o pagamento de "royalties" e as possibilidades diversas nas prestações de serviços e consultorias são alguns dos motivos que tem levado o Brasil a seguir o exemplo dos governos da Dinamarca, Índia e Alemanha. Dados do governo brasileiro mostram que se o país comprasse 20 computadores com softwares livres para cerca de 20 mil escolas públicas das mais de 170 mil existentes, o país poderia economizar mais de US$ 200 milhões somente com o não pagamento de licenças. As vantagens econômicas já são visíveis para mais da metade do planeta. Levantamento recente da NetCraft – organização internacional que levanta dados estatísticos sobre o setor – diz que 64,5% dos computadores do mundo usam o Apache – um software livre utilizado para facilitar a conexão de computadores na Web. No Brasil, menos de 10% dos softwares do governo são livres.

O secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santana, também é um defensor voraz do sistema aberto. Segundo ele, além da economia e da segurança, o país ganha autonomia. "O governo ainda gasta mal os recursos porque está atrelado a um modelo muito caro. Por isso, nossa meta é reduzir a dependência dos softwares fechados. Não é justo continuarmos transferindo o tanto que o Brasil transfere atualmente de recursos gastos em propriedade intelectual", explicou.

Ganhar no longo prazo

Apesar de diferentes órgãos do setor público - metrô de São Paulo, a Assembléia Legislativa de Minas Gerais, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (Dataprev) e o próprio Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) - já estarem apostando no novo modelo, a substituição completa da atual estrutura pode demorar décadas. É o que pensa o secretário Santana - prova de que mesmo utilizando-se de uma "excelente ferramenta" o caminho da teoria à prática pode levar tempo.

Como ex-funcionário de uma pequena empresa gaúcha, Santana precisou de 14 anos para reduzir de 25% para 0,58% as despesas totais da empresa com tecnologia. "Hoje ainda não é possível trocar todo o sistema no governo. Mas teremos que ter no setor público uma distribuição de softwares auditada e segura. Só assim vamos diminuir a dependência de fornecedores proprietários", disse. O presidente do ITI, Sérgio Amadeu, é mais otimista quanto à total implantação das mudanças. "Não acho que demore tanto, vai depender como a sociedade vai disseminar essa cultura".

Os primeiros passos para essas mudanças já estão sendo dados. Além de incluir pela primeira vez a questão digital no Plano Plurianual (PPA), órgãos do governo, que até então não usavam o software livre, passaram a trabalhar para implantá-lo. É o caso da Imprensa Nacional, dos Ministério das Comunicações, de Ciências e Tecnologia, da Cultura. "Não vamos forçar o uso de distribuição de determinado software, mas não temos a menor dúvida que o software livre é um sistema estratégico pra nós", concluiu Santana.