Novo modelo na Previdência pode financiar desenvolvimento do país

17/09/2003 - 10h24

Brasília, 17/9/2003 (Agência Brasil - ABr) - Luiz Inácio Lula da Silva entrou para a história como líder sindicalista ao comandar, entre 1978 e 1980, no ABCD paulista, as grandes greves de metalúrgicos que marcaram o tropeço final da transição "lenta e gradual" proposta pela ditadura militar na redemocratização do país.

Mas, é o mesmo Lula, agora presidente da República, quem propõe para o movimento sindical uma "revolução comportamental", como ele mesmo define. "É preciso que os trabalhadores tenham um instrumento de pressão maior do que os que, historicamente, nós tivemos: o direito à organização, o direito à greve. Ter dinheiro é ter parte do poder no mundo globalizado e no mundo capitalista".

O discurso de Lula, no encerramento do I Seminário Internacional de Fundos de Pensão, realizado no fim de maio, no Rio de Janeiro, foi além dessa proposta. O presidente conclamou ao investimento em projetos de cunho social os representantes dos bilionários fundos brasileiros e dos seus multibilionários congêneres internacionais presentes ao evento. "Vocês precisam exercer um papel mais nobre do que o que tiveram até hoje. Queremos ajuda dos fundos de pensão para que se discuta, de uma vez por todas, como eles podem contribuir para que possamos resolver parte dos problemas que parecem insolúveis no Brasil".

Para boa parte dos trabalhadores brasileiros, acostumada a contar com o parco benefício do salário mínimo pago pela previdência pública, pode parecer estranho falar em aposentados com patrimônio bilionário. É que, hoje, os fundos de pensão desse novo modelo defendido pelo governo contam com apenas 2,3 milhões de participantes. Uma carta de ativos que chega a R$ 200 bilhões.

Se parece muito, imagine que a expectativa, com a aprovação da reforma da Previdência, é que esse montante cresça para R$ 420 bilhões em 2007 - mais que o dobro do total atual. Estudo elaborado pelo professor Kaizô Beltrão, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), calcula que, num horizonte pessimista, é possível agregar inicialmente ao sistema 3,2 milhões de trabalhadores. Os números, no entanto, mostram que as mudanças propostas pela reforma podem resultar no ingresso de até 15,7 milhões de trabalhadores no sistema, o que significa ativos da ordem de R$ 800 bilhões em 2012.

Novo modelo

A Reforma da Previdência que tramita no Congresso Nacional cria um novo modelo para o pagamento de aposentadorias no país. Um de seus pilares é a previdência complementar. A criação dos chamados fundos de pensão para servidores públicos foi um projeto do governo passado, mas encontrava forte resistência do funcionalismo público, devido à falta de garantias no controle nos fundos.

A saída encontrada pelo governo atual foi sua inclusão na Proposta de Emenda Constitucional. Uma vez constitucionalizada a existência dos fundos, restará ao servidor público contribuir para um plano de previdência complementar ou conviver durante toda sua vida pós-laboral com o benefício máximo de R$ 2,4mil - limite de aposentadorias fixado pela reforma.

A criação dos fundos chegou a ser questionada, sob o argumento de que abriria espaço para a privatização da Previdência Social no país. Opositores e até mesmo aliados do presidente Lula argumentam que a reforma está sendo realizada para promover o setor de previdência complementar. Os especialistas em Previdência Social e Complementar, no entanto, rebatem as críticas, porque avaliam que, ao contrário de privatizar o sistema, a constitucionalização dos fundos de pensão vai representar uma mudança econômica que trará benefícios para toda a sociedade.

"A alteração proposta pelo governo vem, em seu bojo, com uma verdadeira política de incentivo ao crescimento do setor. Isso é muito positivo, porque significa maior poupança interna e maior independência do país do capital externo, que é extremamente volátil", avalia o presidente da Associação Brasileira de Entidades Fechadas de Fundos de Pensão (Abrapp), Fernando Pimentel. "O Brasil precisa aprovar os fundos de pensão para ter uma economia mais saudável. Toda forma de criar mais previdência de longo prazo ajuda o país social e economicamente", defende o ex-secretário do Ministério da Previdência, José Roberto Savóia.

Nas duas maiores centrais sindicais do país - Central Única dos Trabalhadores (CUT) e Força Sindical -, a torcida pela instituição dos fundos de pensão para funcionalismo público é grande. "A CUT defende a tese de que os fundos de pensão protegem os trabalhadores. Com eles, acaba o argumento de que não há dinheiro para pagar aposentadoria", afirma João Vacari Neto, responsável na CUT pelos assuntos previdenciários. Ricardo Patah, da Força Sindical, avalia que a instituição da previdência complementar vai "atenuar a vida de nossos aposentados e vai em busca de uma utopia que amanhã pode ser realidade".

Expectativas

A razão para tanto apoio é simples. Como o dinheiro dos fundos de pensão tem que permanecer no Brasil, eles significam uma poupança interna mais segura que a existente hoje, de 17% do PIB. Para este ano, a previsão é que a poupança interna fique em 18,5% do PIB de cerca de R$ 1,3 trilhão. Neste panorama, uma poupança interna de R$ 800 bilhões que precisa ser mantida no Brasil para o pagamento de futuros benefícios gera um horizonte para governo nenhum botar defeito. "A poupança previdenciária tem que estar aqui por pelo menos vinte anos. Aí, é fundo de pensão na construção civil, na bolsa de valores, na socialização do capital com a participação acionária nas empresas", afirma Pimentel.

Além disso, a garantia de uma aposentadoria melhor e sustentada para uma parcela dos trabalhadores leva os especialistas a vislumbrar um futuro otimista. Mesmo representando menos de 10% da população brasileira e pouco mais de 21% da população economicamente ativa, estes mais de 15 milhões de pessoas terão mais dinheiro para consumir, o que significa mais estímulo para a produção nacional, impostos e, no final da ponta, uma economia mais saudável.