Crise política, ausência de judiciário e militares organizados levaram ao Golpe em Guiné

16/09/2003 - 18h04

Danielle Soares
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Alguns analistas afirmam que o golpe em Guiné Bissau já estava previsto, devido às várias acusações de fraude nas eleições previstas para outubro, além da dissolução do parlamento, em novembro do ano passado. O golpe de estado, ocorrido neste domingo, no pequeno país de língua portuguesa na África Ocidental, teve como líder o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Veríssimo Correia Seabra, que se auto declarou presidente interino do país. O chefe comandou uma série de tentativas para desestabilizar o governo do presidente Kumba Yalla.

De acordo com o diretor do Instituto Brasileiro de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (Unb), José Flávio Sombra Saraiva, o golpe possui três principais causas. "Há um setor militar organizado que, de uma forma autoritária, deseja implantar um sistema de direito sobre a tutela dos militares. A presença desse grupo, politicamente forte e que entendeu ser capaz de manter a normalidade política no país, é um dos pontos mais importantes do golpe. Também as crises políticas e a ausência do poder judiciário criam um clima propício para a tomada dos militares", disse Saraiva em entrevista a Radiobrás.

Segundo ele, o golpe prejudica o objetivo de construir uma democracia e elimina o diálogo político. "Essa idéia de fazer a democracia refém de um grupo armado, não me parece o caminho adequado. O melhor seria a pedagogia política dos militares, no sentido de promoção das eleições e convocação dos setores organizados para uma solução negociada, contando com a presença da CPLP, que participou da crise de 98" afirmou.

O primeiro ministro de Guiné Bissau, Marco Antônio Pires, temia que após as eleições, caso a oposição político partidária ganhasse, houvesse uma nova guerra civil. Com o golpe militar, segundo Saraiva, a situação pode se agravar, pois desperta desconfiança no sistema político, naqueles que controlam o poder. "Para esses militares se manterem na via democrática, foi necessário a garantia do aumento de salários e a manutenção de uma certa unidade política do exército, diante de uma fragmentação de setores", disse ele.

"As eleições foram marcadas para o dia 12 de outubro, pode ser que o grupo que tomou o poder venha estabelecer como meta, até para acalmar a opinião pública e mostrar que tem um corte democratizante. Para que tenhamos uma conclusão, é necessária uma avaliação do governo de Sabra", explicou o diretor.