Amorim: "se voltamos de mãos vazias, haverá dúvidas sobre o futuro da OMC"

15/09/2003 - 15h09

Milena Galdino
Repórter da Agência Brasil

Brasília - Fracassou, em Cancún, a reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio. Os 146 países presentes ao encontro dariam seqüência às metas definidas há dois anos em Doha, no Catar, mas nada ficou acertado. Com isso, provavelmente não será obedecida a data limite para a liberalização do comércio internacional, estabelecida para o dia 1 de janeiro de 2005.

Além da questão agrícola, menina dos olhos do Brasil e de outros países exportadores, mal chegou a ser discutida de maneira ampla. As conversas desandaram quando Europa e os países da ACP (África, Caribe e Pacífico) discordaram sobre os quatro itens de Cingapura – regulação das concorrências, investimentos, maior acesso das multinacionais aos mercados e transparência em contratos governamentais.

A Europa chegou a abrir mão dos dois primeiros temas, concorrências e investimentos – gesto interpretado pelo grupo dos exportadores agrícolas, como o Brasil, como uma concessão a ser relembrada pela União Européia quando a questão agrícola fosse posta à mesa. Mesmo assim, os países da ACP forçaram para que os dois restantes saíssem da pauta e, então, não houve acordo. Ministros do Quênia e da Uganda deixaram o local e encerraram a reunião, já que pelas normas da OMC tudo deve ser acertado em consenso.

Obstáculos

"Não há consenso porque as diferenças são enormes. Nos veremos novamente em dois anos", encerrou George Odour Ong´wen, da delegação do Quênia. Pouco antes da saída dos africanos, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, advertiu que um fracasso como o que aconteceu em Seattle, em 1999, poderia colocar a OMC em xeque. "Se voltamos para casa de mãos vazias, os países em desenvolvimento saem no prejuízo e haverá dúvidas sobre o futuro da organização", sentenciou.

Celso Amorim acredita que o erro dos países ricos foi subestimar a resistência dos mais pobres. Já Robert Zoellick, representante dos Estados Unidos em Cancún, sustenta que o colapso se deve ao fato de que muitos países queriam tirar mais vantagens do processo do que exatamente negociar.

Boa parte dos analistas de política e economia concorda que a Europa deixou passar a hora certa de ceder na negociação, talvez porque dava como certa a possibilidade de a reunião se estender até a noite de segunda-feira. Especialistas em negócios acreditam que a União Européia insistia nos temas de Cingapura para, uma vez derrubados, justificar que já teria feito concessões demais para ainda fazer ceder na questão dos subsídios agrícolas.

Papel brasileiro

Se a Europa sai como responsável pelo fracasso ao lado do ACP, a delegação brasileira volta para casa fortalecida pela façanha de orquestrar uma nova aliança, denominada a princípio G-20, e depois, por causa de novas adesões, passou a ser conhecido por Gplus (ou G-mais). O bloco, formado por países em desenvolvimento que tem grande exportação agrícola, inclui países como China e Índia e representa cerca de 55% da população mundial. Depois de anunciado o fim da reunião, delegados de vários países do Gplus garantiram que os países ficarão unidos na OMC.

Com o fracasso, o documento assinado pelos 146 países no México limitou-se apenas a reiterar o compromisso dos países com o objetivo de reduzir subsídios agrícolas, sem contudo estabelecer prazos. Também ficou definido que novas reuniões da OMC sobre estes assuntos acontecerão na sede da OMC, em Genebra. Os ministros da OMC devem se encontrar na Suíça em 15 de dezembro.