Prefeitos desembarcam no Congresso em busca de R$ 6,5 bilhões

10/09/2003 - 17h20

Marcos Chagas e Iolando Lourenço
Repórteres da Agência Brasil

Brasília - Os prefeitos, que até agora estavam distantes da briga pela divisão do bolo tributário nacional, arregaçaram as mangas e desembarcaram hoje, no Congresso, dispostos a aumentar o seu quinhão na reforma tributária. A "Marcha dos Prefeitos", que reuniu cerca de mil e quinhentos municipalistas na capital federal fez os líderes dos partidos aliados ao governo se desdobrarem para explicar as limitações orçamentárias da União. Enquanto a reforma tributária proposta contempla os municípios com mais R$ 3,7 bilhões, os prefeitos reivindicam, pelo menos, R$ 6,5 bilhões. O dilema do governo é chegar a este valor sem aumentar a carga tributária nem retirar recursos dos estados ou da União.

No calor da emoção, prefeitos e lideranças governistas travaram no Salão Verde da Câmara ásperos diálogos, que por vezes quase chegaram as vias de fato. Foi o caso, por exemplo, de uma discussão entre o vice-líder do Governo, deputado Professor Luizinho (PT-SP), com o prefeito de Malacaxeta (MG), Fábio Augusto Ramalho dos Santos. O parlamentar questionou a competência administrativa dos prefeitos que gritavam palavras de ordem no Salão Verde, enquanto o prefeito exigia respeito e pedia que o governo resolvesse o problema dos pequenos municípios já que os grandes tiveram seus pleitos atendidos. "Alguns prefeitos que estão gritando é só aprenderem a controlar bem (seus gastos) e terem competência à frente de seus Executivos que não terão problema", gritou Professor Luizinho.

Cerca de 200 prefeitos tentaram invadir o plenário da Câmara, mas foram contidos pelos seguranças da Casa. O vice-líder do PT, deputado Paulo Bernardo (PR), condenou o ato. Afirmou que os prefeitos "estão fazendo o trabalho errado ao xingarem os deputados". Esta atitude, acrescentou, não muda em nada a reforma tributária. "Esta não é a forma de pressionar", afirmou o parlamentar.

Coube ao líder do Governo no Senado, Aloízio Mercadante (PT-SP), tentar convencer os prefeitos, de forma serena mas firme, das limitações enfrentadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Numa roda informal, no Salão Negro do Senado, Mercadante descartou, de cara, a possibilidade de partilha da Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF) com estados e municípios. Segundo ele, a CPMF é um tributo que já é totalmente partilhado. O Sistema Único de Saúde (SUS) fica com 20% dos R$ 23 bilhões arrecadados, que são repassados para estados e municípios, explicou. Outra parte – 0,10% dos 0,38% tributados sobre as movimentações financeiras - serve para compor o caixa da Previdência Social.

Mercadante ressaltou que o programa Fome Zero também recebe uma parcela dos recursos da CPMF. Até dezembro, o programa de combate a fome deve atingir dois mil municípios, lembrou Mercadante aos prefeitos. "A CPMF é um tributo totalmente vinculado e, por isso, não podermos partilhá-lo. O que podemos partilhar são os impostos de importação e exportação, o Fundo de Desenvolvimento Regional, o Fundo de Compensação das Exportações e o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e o Imposto de Renda (IR)", ressaltou.

Na conversa, Mercadante reconheceu que os municípios são mais capazes de administrar os recursos destinados a área social e de infra-estrutura. Segundo ele, quando a gestão é descentralizada, abre um espaço para a maior fiscalização pelo cidadão da aplicação deste dinheiro e não existe o gasto de administração destes recursos. O líder do governo lembrou que pelo menos 25% em média do que é repassado aos municípios é gasto com transporte e gestão dos programas nacionais.

Os prefeitos não cansaram de cobrar do governo o excesso de concentração dos recursos arrecadados com impostos pela União. Na medida em que a cobrança era feita, a explicação era repetida por Mercadante. "Várias medidas nesta direção que não foram adotadas nos últimos oito anos, foram tomadas nestes oito meses", argumentava.

"A atualização do Imposto Sobre Serviços (ISS) , por exemplo, incluiu os bancos e empresas de telecomunicações na base de arrecadação. Os recursos do ISS são importantes na base de arrecadação dos municípios", destacou o senador.

"Nós estamos buscando, ao invés de aumentar a carga tributária, dentro da carga tributária atual repartir com a limitação que é preservar o controle da dívida pública", explicou o senador.

Se por um lado, o líder governista repetia aos prefeitos as limitações enfrentadas na distribuição dos recursos tributários, estes tinham na ponta da língua a cantilena da falta de dinheiro e da crise financeira municipal. João Carlos, prefeito de Camacuã (RS), disse que até o momento a reforma tributária proposta não atende suas necessidades. Ele citou pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios demonstrando que 60% dos municípios brasileiros estão "praticamente quebrados". Em Camacuã, o prefeito disse que foi obrigado a reduzir a qualidade dos serviços prestados à comunidade para atender as demandas de saúde e educação que são transferências vinculadas.

Já Luis Carlos Beraldo Leite, prefeito de Piquete, cidade do Vale do Paraíba (SP), acusou o governo, afirmando que a culpa pela precariedade de recursos aos municípios deve-se aos compromissos de superávit primário assumidos pelo governo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). "Arrocharam tanto, inclusive com demissões, que acabou comprometendo a economia e, por conta disso, o repasse do Fundo de Participação dos Municípios vem caindo".