Brasília, 22/8/2003 (Agência Brasil - ABr) - No ano passado, a balança comercial brasileira apresentou superávit de US$ 13,11 bilhões. A venda de produtos como a soja, o suco de laranja e aviões - entre os mais vendidos - renderam ao país divisas da ordem de US$ 60,298 bilhões. No mesmo período, o Brasil exportou idéias. Não cobrou por elas e até investiu recursos para que fossem implantadas. São as chamadas ações de cooperação internacional.
Projetos sociais elaborados por técnicos brasileiros já estão implantados em dez países africanos, em praticamente toda a América do Sul, além de América Central e Caribe. Programas como Bolsa-Escola, Alfabetização Solidária e o de combate à Aids estão entre os mais conhecidos no exterior. A difusão de uma imagem positiva do Brasil é apenas uma das formas de retorno para o país. A aproximação solidária facilita futuros acordos comerciais com os países beneficiados. A cooperação ainda une as nações em desenvolvimento e aumenta o poder de barganha nas relações comerciais com os países mais ricos.
A principal forma de colaboração é a transferência da tecnologia necessária para a implantação das ações sociais. Técnicos brasileiros são enviados ao exterior para prestar consultoria aos governos dos países interessados. Quando o Brasil não manda os especialistas, recebe comitivas internacionais que realizam o treinamento em solo brasileiro. Os custos com viagens e estada em países estrangeiros são arcados pelo Ministério das Relações Exteriores, por meio da Agência Brasileira de Cooperação (ABC). Para este ano, o orçamento da ABC é de R$ 5 milhões. Desse total, R$ 3 milhões serão destinados aos projetos de cooperação internacional. Além disso, os projetos contam com o investimento dos ministérios responsáveis pelo desenvolvimento dos programas e com recursos resultantes de parcerias com organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), a Organização dos Estados Americanos (OEA), a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
O presidente da ABC, embaixador Marco César Naslausky, revela que a demanda pela colaboração brasileira supera a capacidade financeira e os recursos humanos do país. Por isso, não é possível atender a todas as solicitações. Segundo Naslausky, a colaboração brasileira com nações em desenvolvimento se intensificou no final da década de 80, quando o país alcançou a classificação de nível médio de desenvolvimento. Nessa época, o Brasil deixou de ser destinatário de programas sociais dos países mais ricos e iniciou seu programa de ajuda internacional. "O Brasil é um parceiro natural, não tem nenhuma divergência política e boas relações nos diversos continentes. Apesar de estar em um nível de desenvolvimento superior ao de muitos desses países, nós estamos mais próximos deles que as nações ricas: temos problemas semelhantes. Por isso nossos projetos sociais são tão requisitados", explica.
Os programas das pastas de Saúde e Educação são os mais solicitados no exterior. O Alfabetização Solidária, que ensina a sociedade a se mobilizar contra os altos índices de analfabetismo, por exemplo, foi implantado em seis países da África, oito da América Latina, além de El Salvador e Guatemala. Essas mesmas nações também importaram o Programa Bolsa-Escola. Criado em 1995 e aplicado inicialmente pelo Governo do Distrito Federal, o programa oferece uma ajuda em dinheiro para as famílias com filhos que freqüentam as aulas.
O apoio brasileiro termina quando os técnicos locais aprendem a lidar com a metodologia dos projetos sociais. Nesse ponto, a administração dos programas fica a cargo dos governos de cada um dos países. Em Moçambique, por exemplo, o Alfabetização Solidária, implantado como projeto piloto a partir da cooperação brasileira, foi estendido para todo o país e incorporado às políticas públicas. "O nosso objetivo não é começar um projeto que se eternize. Nós transferimos a tecnologia, saímos, vamos para outro lugar desenvolver outras ações. O tempo que ficamos em um projeto depende do grau de engajamento do país, do grau de segurança de que aquilo não vai se perder", afirma Naslausky.
A implantação do Bolsa-Escola no Equador teve uma particularidade. Como o país não possui um sistema bancário interligado e presente em todos os municípios, a maior dificuldade para os técnicos brasileiros foi adaptar o programa, que necessita de um meio de transferência de renda, à realidade do lugar. Em vez dos bancos, os técnicos vincularam o pagamento da bolsa a organizações não governamentais. O governo transfere o dinheiro para essas entidades e elas repassam às famílias de estudantes matriculados. Nesse caso, foram necessários dois anos até que o programa fosse implantado. Hoje, são atendidas 150 mil famílias no Equador. "Cada país tem a sua particularidade, que deve ser levada em conta. O Bolsa-Escola vai variar sempre de um lugar para o outro, e os técnicos devem estar preparados para lidar com as diferenças", diz o secretário de Inclusão Educacional do Ministério da Educação, Marcelo Aguiar. Nos últimos quatro anos, ele viajou o mundo ao lado do atual ministro da Educação, Cristovam Buarque, para difundir o programa.
Quando o assunto é saúde, o programa de prevenção e combate à Aids do Ministério da Saúde é o mais requisitado, principalmente na África, onde a doença matou 17 milhões de pessoas nas duas últimas décadas. De cada três infectados pela Aids no planeta, dois são africanos. As ações brasileiras já são desenvolvidas em, pelo menos, oito países do continente. Além de transferir a tecnologia desenvolvida no Brasil para a produção de medicamentos anti-retrovirais, o país oferece cursos de capacitação a profissionais de saúde africanos e colabora na elaboração de campanhas educativas. Outra ação brasileira é a transferência de recursos para o tratamento de 100 portadores de HIV em cada um dos países com os quais mantém a colaboração. O ministério investe US$ 1 milhão por ano no desenvolvimento da cooperação internacional.
Paula Medeiros e
Lilian Tahan