Brasília, 16/8/2003 (Agência Brasil - ABr) – Mesmo diante da pressão de partidos aliados que pleiteiam cargos no governo, especialmente o PMDB, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva descartou que esteja em seus planos fazer uma reforma ministerial neste momento.
Em entrevista à revista Veja que chega às bancas hoje, o presidente resume a sua satisfação com os atuais ministros fazendo, mais uma vez, uma comparação com o futebol. "Os técnicos de futebol não tiram de campo um jogador com dez minutos de jogo. Os governos também devem fazer o mesmo", disse.
Lula citou como exemplo o ministro de Segurança Alimentar, José Graziano. O presidente lembrou que nos primeiros meses de governo foi pressionado a tirá-lo do cargo, mas se manteve firme por confiar no trabalho de Graziano. O presidente afirmou que, se vier uma reforma ministerial, ela não será realizada antes do primeiro ano do governo.
"Sempre disse aos prefeitos e governadores do PT que eles devem fazer uma avaliação da equipe ao fim dos primeiros doze meses de gestão. Não antes. E não devem agir com base em manchete de jornal. Se eu fosse levar a sério o que diziam, o José Graziano teria caído com três meses de ministério", ressaltou.
As especulações do início de agosto sobre o afastamento do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, também foram duramente criticadas por Lula. Segundo ele, quem especular contra o ministro "vai perder". E completou: "Se alguém quiser ganhar alguma coisa apostando, recomendo que aposte a favor do Palocci. O Palocci é da minha mais inteira confiança. Ele não está aqui porque quis, ele está aqui porque eu quis que ele estivesse aqui. Ele é um dos companheiros em quem eu deposito o maior grau de confiança, o maior grau de companheirismo e de lealdade", enfatizou.
RADICAIS
Mesmo com sua equipe de trabalho formada por grandes "companheiros" de longa data, Lula também aproveitou a entrevista para fazer um desabafo sobre os chamados "radicais do PT".
Na opinião do presidente, existe um certo tipo de pessoa que "é melhor ficar contra você do que a favor". Ele lembrou uma conversa que teve em 1979 com o amigo economista Celso Furtado, quando ele disse que os ultra-esquerdistas servem de alerta para mostrar um caminho para onde seguir, nem tanto para a esquerda, nem para a direita, na política. "No fundo, eles te ajudam a continuar a caminho do meio. Isso é uma coisa que me dá certa tranqüilidade", garantiu.
Lula afirmou que não se irrita com o comportamento de antigos aliados que, hoje, criticam abertamente o seu governo e fez uma revelação: disse que presidente da República não tem direito de ficar irritado. "Aos 57 anos, eu já apanhei tudo o que tinha de apanhar. Já gastei minha capacidade de ficar irritado". Problemas dentro do governo ele descarta. Disse que está muito satisfeito com sua equipe de trabalho, e citou nominalmente o ministro Ciro Gomes, da Integração Nacional, como um dos seus colaboradores com quem mantém uma excelente relação.
Nem as cobranças de toda a sociedade por mudanças nas ações do governo irritam o presidente. Na avaliação de Lula, é um direito da população cobrar. O presidente, no entanto, se manteve firme no propósito de implementar as medidas que considera as mais corretas para o país. "Eu não quero ser parte de uma onda. Vem uma onda bonita, todo mundo quer surfar, depois a onda acaba e ninguém sabe o que fazer. Temos de ter paciência. Não se pode ficar dando choque na economia. Vamos aguardar".
REFORMA AGRÁRIA
O presidente da República reafirmou a disposição do governo em não apenas distribuir terras, mas dar aos novos assentados meios para que possam sobreviver de forma digna.
"Continuo acreditando que nós vamos fazer um grande acordo com os trabalhadores que lutam pela reforma agrária neste país, mas não podemos repetir o erro cometido até agora. Quantos assentamentos produzem efetivamente? (...) Levar alguém para o campo significa providenciar assistência técnica, permitir o acesso à semente e ao financiamento no tempo certo e garantir o preço. Eu já falei várias frases de efeito e mais tarde percebi que eram exageradas. Mas posso avisar aos interessados que neste país ninguém faz reforma agrária nem na marra nem no tapa. A reforma vai ser feita no tempo certo e na medida do possível", enfatizou.
Nem os tantos desafios que têm pela frente fazem Lula se arrepender de ter assumido a Presidência da República. Ele garante que sonhou muito com este momento e revelou que vem abrindo mão inclusive de sua vida particular para conseguir transformar o Brasil em uma nação mais digna.
"Se tem alguém que não pode reclamar das restrições ligadas ao cargo de presidente sou eu. Briguei muito para estar onde estou. Passei a vida inteira desejando ser presidente da República. Se tem uma coisa que eu faço com prazer é o exercício do meu mandato. Tenho de dedicar a minha vida a isso. Eu sei que estou jogando minha história neste mandato. Agora eu tenho gente na porta de casa sábado, domingo e feriado. Tem gente me vigiando o tempo inteiro. Mas quer saber o que é pior do que isso? É não ter isso", garantiu. E encerrou: "sempre brinco com meus amigos dizendo o seguinte: sabe o que é a coisa pior do que dar autógrafo e tirar fotografia? É o dia em que ninguém quiser autógrafo nem quiser tirar fotografia com você".