O promissor e difícil mercado da África do Sul

11/08/2003 - 10h46

Johannesburgo, África do Sul (Agência Brasil - ABr) - O Brasil entrou de vez na disputa pelo emergente mercado sul-africano, uma das principais vitrines do comércio internacional, e quer acelerar as discussões sobre o livre comércio entre o Mercosul e a União Aduaneira dos Países da África Austral (Sacu). Mas para aumentar a fatia de 2% das vendas do continente sul-americano para a África do Sul será preciso enfrentar concorrentes fortes com presença sólida no país, como a União Européia, responsável por 38% das exportações e a Ásia, de onde os sul-africanos compram 33% do total importado.

A América do Norte vem em terceiro lugar, com 13% das vendas. A América do Sul só não está abaixo do restante da África, com o qual empata no ranking. Por parte do governo africano há interesse em estreitar os laços com o Brasil, mas os empresários terão que dobrar o perfil exigente e acomodado do importador sul-africano, que dá preferência a parcerias já existentes. Entre as exigências estão o ISO 9002, certificado de qualidade, e aprovação da Europa. A qualidade do rótulo e do empacotamento, a confiabilidade de suprimento e entrega pontual são fatores dos quais eles não abrem mão.

"A escolha do agente certo e do distribuidor é a chave do sucesso para quem deseja entrar na África do Sul", comenta Duncan Bonnett, consultor da Whitehouse and Associates e um dos maiores especialistas do país em comércio exterior. Segundo ele, muitos representantes comerciais da África do Sul possuem grande leque de produtos. "As importadoras têm agências exclusivas e não sentem necessidade de encontrar parceiros potenciais. Além disso, todos os dias mercadores estão entrando no país na tentativa de furar o bloqueio", conta. Duncan explica ainda que as empresas sul-africanas raramente viajam para outros lugares do mundo com o objetivo de encontrar um parceiro prospectivo.

Os mercados de importação, exportação e varejo são dominados por um pequeno grupo de participantes em cada categoria. Setores tradicionais, como mineração, manufaturados, agriculturas, roupas e têxteis têm uma tradição grande de fornecedores locais e internacionais. "Se o exportador brasileiro quer vender aqui, precisa visitar o mercado para apresentar o seu produto ao usuário final e aos distribuidores", aconselha o consultor, ao informar que o sul-africano não muda fácil de parceiro e precisa conhecer bem o interlocutor.

Em 1994, com a eleição de Nelson Mandela para presidente e a introdução do regime democrático, a África do Sul livrou-se do embargo internacional e iniciou o processo de abertura do mercado, sendo declarada, pelos Estados Unidos, como um dos dez maiores mercados emergentes do mundo. A partir daí, vem multiplicando os índices de crescimento econômico anual, ultrapassando, no final dos anos 90, a barreira dos 3%. A meta do governo, no entanto, é chegar a 5% de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e o presidente Thabo Mbeki não
mede esforços para estimular o setor produtivo, ampliar as suas exportações e as importações dos produtos necessários para dar dinamismo à economia.

Por isso, o Brasil possui grandes chances de dobrar de US$ 1 bilhão para US$ 2 bilhões a corrente de comércio com o país até 2006, conforme deseja o ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. Em alguns setores o Brasil já tem presença garantida e perspectiva de ampliação das vendas. No caso da cerâmica, por exemplo, o Brasil ocupa o terceiro lugar, com 11% das exportações para a África do Sul. De acordo com o empresário e vice-presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmicas e Revestimentos, João Oscar Bergstron, a perspectiva é que no próximo ano as vendas, hoje em US$ 5 milhões, ampliem em 50%. Membro da missão comercial organizada pela Agência de Promoção das Exportações (Apex), Bergstron se disse impressionado com a demanda que encontrou em Johannesburgo e na capital Pretória. "O governo está investindo na construção de casas populares e isso incentiva a construção civil. Em dez minutos, fechei negócio com uma grande loja de material de construção", comentou o empresário.

Outro setor que abre espaço para Brasil é o de couros e calçados. "A indústria local de calçados está em constante declínio desde 1989, na década passada chegou a cair 61%", comenta Bonnett. Neste período o mercado vem sendo dominado pelas importações baratas provenientes da Ásia. A estimativa é que 75% das vendas de calçados constituem estoque importado, sendo a China o maior fornecedor, de onde saem 80% dos calçados. A outra porção é dominada pelos italianos, de preço e qualidade muito superiores aos chineses. Os brasileiros estão entrando no meio termo, apresentando produtos bem acabados e preços competitivos. "Os sapatos
brasileiros estão em moda aqui. Os consumidores gostam por causa da qualidade, das cores e dos preços", diz a lojista Lilia Tradkovic, que afirma vender uma média de 10 sapatos
brasileiros por dia.

Segundo Raul Ludovich, presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos para Couros e Curtumes (Abramec), em dez anos as exportações de couro para a África do sul caíram 50%. "Agora, o governo africano está dando um novo impulso. Trata-se de um setor que absorve muita mão de obra e há interesse do governo em incentivar", conta Ludovich. O couro importado pelo país é destinado basicamente aos calçados e estofados para automóveis. O governo sinalizou o interesse quando convidou, há três anos, lideranças do setor para fazer palestra sobre a experiência brasileira. "Eles acham que o Brasil pode ser um grande parceiro", diz o empresário. Automóveis, aeronaves e carnes são áreas com presença no mercado sul-africano.

* A repórter viajou à África do Sul a convite da Agência de Promoção das Exportações do Brasil (Apex).