C&T - Como o senhor classifica o design do móvel brasileiro hoje, no sentido de funcionabilidade, criatividade?
Itiro - O design no Brasil foi introduzido em 1963 quando se fundou a primeira escola de Desenho Industrial, no Rio de Janeiro. Nos últimos dez anos, houve uma extensão muito grande, acho que devem existir cerca de 100 cursos de design hoje no país. O problema é que não há, em contrapartida, formação de professores. Assim, esses cursos, infelizmente, são de nível médio para baixo. E, nas universidades federais nós temos todo o problema de serviço público, como contenção de despesas, principalmente de despesas de custeio, laboratórios, é uma dificuldade. Então, esse pessoal que chegou depois, não conseguiu pegar os grandes investimentos nas universidades federais, na década de 70. Como o nosso curso aqui na UnB é de 1989, nós já passamos pelo período de dificuldade, sem muitos investimentos.
C&T - Qual a diferença de design para projeto e desenho industrial?
Itiro - É a mesma coisa, só uma questão de terminologia. O design é uma palavra estrangeira e foi trazido para o Brasil como desenho industrial, mas depois os próprios profissionais dessa área resolveram adotar o termo design, que é referência internacionalmente.
C&T - A ergonometria está mais relacionada ao projeto ou ao design?
Itiro - O design faz projetos de produto. Ele tem duas grandes áreas de especialização, que é o projeto do produto, tipo móveis, embalagens, vestuários, jóias. E depois tem uma outra área que é de programação visual, pegando mais à parte de design gráfico, design de website. Nós temos essas duas especializações (habilitações) aqui na UnB.
C&T - E o profissional brasileiro, na sua maneira de ver, em que área se sai melhor?
Itiro - O pessoal de design em programação visual tem mais oportunidade de trabalho, há uma aceitação mais imediata do mercado. O design de produto já é mais difícil, requer especialização. O aluno graduado na UnB tem que se especializar em alguma coisa fora daqui, porque o nosso curso ainda não prepara a pessoa para atuar direto no mercado. Acho que todo curso universitário é mais ou menos assim, só fornece os conhecimentos gerais.
C&T - O design visual, hoje, seria muito mais prestigiado, em função do forte apelo visual colocado para a sociedade?
Itiro - Ambos os designs são visuais. Só que o objeto de trabalho é diferente. Um trabalha mais na área gráfica e na área de informações, enquanto nós trabalhamos mais com a indústria, produtos industrializados.
C&T - Em qual vetor o país se destaca mais, na parte industrial, na de embalagens ou de móveis?
Itiro - O design ainda não foi adotado pelas nossas empresas. É um processo um pouco lento. Há alguns setores que já empregam muitos designes e estão tendo sucesso com esse investimento. Por exemplo, na área de vestuário, o Brasil está conseguindo exportar, principalmente a moda praia. No setor de móveis, também estamos conseguindo exportar, sobretudo o pessoal do Sul. E temos ainda algumas coisas esporádicas no setor de eletrodomésticos.
C&T - Os profissionais que trabalham com embalagens de produtos, são na sua maior parte formados em cursos médios, não de curso superior, é isso mesmo?
Itiro - É, esse é outro problema. A profissão não é regulamentada, então qualquer pessoa pode trabalhar nessa área. Diferente de médico, por exemplo, que exerce legalmente a profissão ao fazer uma cirurgia.
C&T - As agências publicitárias, de um modo geral, desenvolvem projetos de embalagens com o pessoal que não é formado.
Itiro - O problema é que as nossas empresas não exigem muita qualidade, então, ás vezes, eles fazem coisas mais superficiais, a preços mais camaradas. Eles preferem isso, a desenvolver um estudo mais aprofundado.
C&T _ O laboratório da UnB , pode fazer certificação?
Itiro - Isso é um processo complexo, nós estamos funcionando há seis anos e desde o início perseguimos o credenciamento junto ao Imetro. Esse ano nós conseguimos um credenciamento da Finep, uma agência de fomento do Ministério da Ciência e Tecnologia, para preparar o laboratório para obter o credenciamento do Imetro.
C&T - Quando o senhor acredita que o credenciamento deve sair?
Itiro - Acho que em seis meses, no máximo.
C&T - O que o credenciamento acrescentaria ao LabMov?
Itiro - Com ele podemos fornecer laudos de conformidade. Existe uma norma técnica, o empresário então fabrica de acordo com essas normas, mas aí tem que ter alguém para investigar para dar o laudo certificando que essas norma técnica foram seguidas e é aí que nós entraríamos no processo.
C&T - Hoje, o laudo do LabMov não pode dizer isso?
Itiro - Não. O problema é que, por exemplo, um órgão público vai comprar um móvel, ele especifica que a peça tem que seguir tais normas e a traz para testarmos, para confirmarmos que está de acordo com as normas. Vai depender desse órgão se aceita ou não o resultado apresentado, pois nós ainda não somos credenciados. Mas, acho que o único laboratório credenciado no Brasil na área de móvel é o Senai/Setembro, no Rio Grande do Sul. Não tenho certeza se o IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), de São Paulo, possuí credenciamento, pois não trabalha muito com teste de móveis. As normas técnicas de móveis surgiram no Brasil a partir de 1998.
C&T - A certificação permitirá que a UnB amplie sua área de trabalho?
Itiro - A idéia é essa.
C&T - Quem é o maior cliente do LabMov hoje?
Itiro - O processo segue a seguinte trajetória: os órgãos públicos lançam uma licitação especificando os estilos de móveis que querem adquiri de acordo com tais normas. Então, todo mundo que se habilita a fornecer, deve apresentar um certificado atestando que seu produto está de acordo com essas normas.
C&T - Ou seja, o Governo é o grande cliente?
Itiro - Não diretamente. Ele exige que os móveis das empresas que respondem a licitação tragam uma certificação.
C&T - É comum o LabMov receber projetos de empresas que pretendem lançar um produto no mercado?
Itiro - Nós fazemos teste e verificando deficiência em alguns itens podemos prestar uma assessoria as empresas para que melhore o produto, para que os problemas detectados sejam superados. Isso já ocorreu muitas vezes. Nós acabamos de desenvolver um móvel para micro regulável, para a Saneago, de Goiás.
C&T - O fato de o LabMov estar perto da incubadora da UnB tem ajudado empresas aqui da região?
Itiro - Acho que não tem nenhuma incubadora no setor de móveis. Nós estamos montando um núcleo de desenvolvimento de produtos em convênio com o Senai e Sebrae, então pretendemos equipar o laboratório para prestar serviço as empresas aqui da região.
C&T - Compensa para uma pessoa trazer um móvel para testar aqui?
Itiro - Não compensa, pois nosso trabalho é remunerado. Não visamos o lucro, mas temos que pagar as despesas. Acho que não compensa. O que você pode fazer é perguntar para o vendedor se aquele móvel já foi testado, ou se a empresa fornecedora é certificada.
C&T - Os equipamentos utilizados pelo LabMov para os testes, são nacionais ou importados?
Itiro - Foram todos construídos aqui, inclusive por alunos. Os estudantes fazem aqui no laboratório projetos de formação. O laboratório em si, não apenas atende os alunos, como foi feito por eles.
C&T - Que tipos de móveis são enviados ao laboratório?
Itiro - Basicamente três tipos: cadeira, mesa e armário.
C&T - O senhor acredita que com a certificação aparecerão outros tipos de produtos, como cama, quarda-roupa, etc?
Itiro - Pode aparecer. Nosso laboratório é voltado mais para testes de móveis profissionais, de uso em escritórios. O MEC já disse que só comprará móvel escolar certificado, então nós estamos nos preparando para isso.
C&T - Qual a respeitabilidade em relação aos móveis do Brasil?
Itiro - Estamos começando a conquistar o mercado internacional. É um dos grandes setores em que o país tem condição de expandir a produção, melhorar as exportações. Mas falta muito ainda, como design, engenharia, materiais, qualidade e todo o sistema de certificação.
C&T - Com o que o industrial brasileiro está mais preocupado, com o visual ou com a qualidade?
Itiro - O industrial brasileiro é acomodado, ele quer ganhar dinheiro fácil. Se ele puder produzir sem investir nada, ele tenta fazer isso, copiando.
C&T - Hoje em dia, as pesquisas não são muito no sentido de criar, mas sim de adaptar?
Itiro - Aqui no Distrito Federal, muitos empresários são neófitos. É diferente do Sul, por exemplo, que o empresário já é filho de italiano, espanhol, que já trabalhava em fábricas, ou seja, já tem uma noção de indústria. Aqui não, o pessoal tinha comércio, fazenda e resolveu ser empresário. Então a mentalidade é um pouquinho diferente.
C&T - O senhor quer dizer que como o país é muito grande, a cultura influência?
Itiro - Demais. Se pegarmos como exemplo os empresários de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, veremos que eles têm outra mentalidade. Não apenas na questão do indivíduo, mas também o ambiente local que favorece essa industrialização.