Anúncio considerado machista sugere que jóias são o 'viagra para mulheres' e causa indignação

22/07/2003 - 10h25

Brasília, 22/7/2003 (Agência Brasil - ABr) - Uma campanha publicitária voltada para o dia dos namorados vem provocando reações apaixonadas e curiosas até hoje em Brasília. O anúncio, patrocinado por uma joalheria da cidade, compara o viagra, estimulante sexual masculino, a um anel de ouro, cravejado de diamantes com um topázio azul, avaliado em R$ 1.620, à vista.

A socióloga e professora universitária Elen Geraldes considera esse tipo de propaganda pobre. Ela acha que seus autores devem ser processados e criticados pela sociedade porque utilizam recursos que ela não considera éticos nem politicamente corretos. O principal problema de anúncios como esse, segundo a socióloga, é o preconceito e a generalização. "É como se todas as mulheres fossem conquistáveis por jóias, ou seduzidas exclusivamente por isso", observou.

Anúncios com esse tipo de apelo, para Elen, ajudam a construir uma imagem muito superficial da mulher. "Algumas mulheres podem ser assim, outras não", disse a socióloga. Ela lembra que esss abordagem contribui para a construção de um imaginário distorcido nas pessoas. "Quantas adolescentes podem ser influenciadas pelo que a propaganda diz o que elas são?" indaga. A socióloga constata que propagandas como a do viagra feminino induzem a uma auto-estima negativa.

A professora está disposta a processar a empresa e a agência criadora da peça publicitária. Mas teme pela lentidão e a má vontade comuns no julgamento de processos desse tipo pelo Judiciário brasileiro. "O retorno que a gente quer é a punição, a retratação, tanto para o anunciante como para a agência", explicou.

Mas não há consenso sobre o assunto. A estudante de publicidade Zalyphe Soares, de 21 anos, acha que a propaganda é bastante criativa e não vê problema algum. "Eu adorei, achei fantástica. Quem me dera eu tivesse tido essa idéia". Zalyphe revelou que todas as suas amigas e até mesmo a mãe disseram que o "viagra feminino" funciona.

O estudante de geografia Hugo Luís dos Reis não pensa da mesma forma. Ele considera a propaganda vulgar e ofensiva às mulheres. "Isso não funciona com as mulheres. Parece que está comprando a pessoa. O que vale é o convívio, o amor".

A Diretoria da agência que produziu a propaganda, a DPG Associados, defende-se dizendo que uma campanha publicitária, para ser criada, passa por todo um planejamento. A do viagra feminino foi desenvolvida para homens com dinheiro, que gostam de agradar a mulher amada, mas não têm muito contato com jóias. "O homem geralmente entra numa loja e compra a jóia que ele acredita ser a mais bela para a esposa, a namorada ou a amante", diz o diretor de Planejamento da agência, Gustavo Jangola.

Existe todo um ritual que as agências procuram explorar, a partir do imaginário das pessoas. Às vezes, a sedução passa por um belíssimo jantar, uma discoteca, algum programa diferente. O objetivo é sempre um final apoteótico. "A nossa intenção era demonstrar que a jóia não é um presente, mas a demonstração de um sentimento", afirma Jangola. Ele acredita que ninguém dá uma jóia a pessoas desconhecidas.

Segundo Jangola, o laboratório Pfizer, que lançou em 1998 o viagra masculino, um vaso-dilatador peniano, investiu mais de US$ 12 bilhões no desenvolvimento da droga. A agência imaginou uma maneira de agradar mulheres com quantia bem menor mas com resultado semelhante. A intenção, disse ele, "não foi menosprezar nenhum sentimento feminino, mas sensibilizar os homens". Gustavo diz que as críticas se devem ao tema, sexualidade, que por si só provoca discussões. "Algumas pessoas levaram a campanha para o lado pejorativo, em que a mulher pode ser vista como objeto".

O urologista e andrologista do Hospital de Base do Distrito Federal, Aderivaldo Cabral Dias Filho, informou que o viagra, para quem não tem problemas de ereção, é um simples motivador psicológico, independentemente de fazer efeito biológico ou não. Então, o anel funcionaria como um placebo (comprimido inócuo) para a mulher. "É somente uma motivaçãozinha. Se minha mulher precisasse desse tipo de motivação (uma jóia), ela estaria frita".

O efeito do viagra é a ereção. Mas há o perigo de ocorrerem efeitos colaterais, como dor de cabeça, congestão nasal e rubor facial, informou o médico.

Nas experiências realizadas com cegos que não sofriam de disfunção erética, Aderival administrou alternadamente viagra e placebo para ver se haveria mudanças na performance sexual. Ele constatou que o viagra é igual ao placebo em pessoas sem problemas de ereção, ou seja, não melhora a performance. "Na verdade, o beneficio é totalmente psíquico. A pessoa toma e acha que está bem."

A caixa do medicamento com quatro comprimidos gira em torno de R$ 87,00, nas farmácias. Mas o médico adverte que nenhuma medicação deve ser usada sem a prescrição de um especialista. Diante de tanta polêmica, a agência publicitária retirou os out-doors da cidade e os substituiu por uma campanha bem menos polêmica, a do Dia dos Pais.