Dez em cada dez mil adolescentes cometem delitos

09/07/2003 - 8h42

Brasília, 8/7/2003 (Agência Brasil - ABr) - Eles ingressam cedo no mundo do crime. São meninos de baixa renda. São vistos pela sociedade e a polícia como marginais e responsáveis pelas ondas de violência e criminalidade do país, que precisam ser contidas a qualquer custo. Na verdade são crianças e adolescentes vítimas da exclusão social e da rejeição familiar que buscam melhores condições de vida transgredindo a lei. O Brasil tem 21, 8 milhões de adolescentes. Deste total, 10 em cada 10 mil cometem algum delito que resulta em uma medida sócio-educativa. Dos delitos, 70% são furtos e roubos. A maioria acaba tendo como destino as unidades de internação. Os dados são do Departamento da Criança e do adolescente, do Ministério da Justiça, de junho de 2002.

Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a privação da liberdade deveria ser aplicada apenas em casos graves, violentos e que ameacem a vida de outras pessoas. O que se vê é o contrário, como informa o estudo do Instituto Latino Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente (Ilanud). Entre junho de 2000 a abril de 2001, o instituto constatou que 45% dos jovens encaminhados a Unidade de Atendimento Inicial da Febem de São Paulo não precisavam ter passado por uma internação, já que foram acusados de crimes contra o patrimônio.

Para o editor da Agência de Notícias dos Direitos da Infância (Andi), Veet Vivarta, o alto índice de adolescentes que são privados de liberdade por terem cometidos furtos deve-se a falta de cumprimento das medidas sócio-educativas previstas no ECA. Um dos motivos, segundo ele, é o rigor dos juízes ao analisar os casos. "Uma parte do Judiciário não percebe o Estatuto como uma forma de reinserção dos jovens", diz.

O estatuto prevê que quando verificada a prática infracional, a autoridade poderá aplicar as seguintes medidas: advertência; obrigação de reparar o dano; pressão de serviços à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade e a internação em estabelecimento educacional, como último recurso.

O excesso de internações de jovens superlota as unidades. No país, existem 265 unidades para receber os infratores. Um relatório produzido pela Comissão de Direitos Humanos em 2001 mostra que a superlotação não é o único problema das instituições. Na ocasião, os parlamentares visitaram 18 instituições em seis estados. Delas, oito apresentavam denúncias de maus-tratos e dez de atendimento médico precário.

Com o intuito de combater a precariedade do atendimento médico nas instituições, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, o Ministério da Saúde e a Secretaria Especial para Mulheres assinam hoje um Protocolo de Intenções para a implantação do Plano Nacional de Atenção à Saúde de Adolescentes em Cumprimento de Medidas Sócio-Educativas. Segundo a gerente de programas da secretaria de atenção à saúde do Ministério da Saúde, Regina Affonso, a idéia é desenvolver políticas que garantam aos adolescentes infratores seus direitos, como atendimento clínico e odontológico.

A aposta do governo e das organizações não-governamentais para que as unidades prisionais não sejam a única alternativa de jovens infratores é multiplicar medidas sócio-educativas bem sucedidas. Para destacar essas iniciativas, o Unicef, o Ilanud, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Andi e a Fundação Educar Dpascoal criaram em 98, o Prêmio Sócio-Educando. Em duas edições, 40 ações já foram premiadas. Uma delas foi a do Centro Sócio Educativo Homero de Souza Cruz Filho, de Boa Vista. No local, os meninos infratores são separados de acordo com o delito cometido. O centro dispõe de áreas verde, para lazer, refeitório e banheiro individualizado. Além disso, os funcionários são capacitados para manterem contato pessoal com os internos.

Segundo Vivarta, como a ação do Centro de Boa Vista, existem muitas outras no Brasil. "Os caminhos estão traçados, basta multiplicar. Temos um laboratório cheio de experiências isoladas". Ele espera que o conhecimento possa ser difundido. "Quando o estado brasileiro vai avançar para multiplicar essas ações?", indagou.

O Estatuto da Criança e do Adolescente comemora no domingo 13 anos e estabelece uma série de normas para garantir os direitos da criança e do adolescente:

- As unidades de internação devem oferecer, entre outras coisas, alojamento, ambiente limpo, roupas, alimentação, ensino, profissionalização e atendimento médico e psicológico.
- É responsabilidade do governo estadual criar e manter as unidades prisionais.
- O estado deve zelar pela integridade física e mental dos jovens internados.

(Luciana Vasconcelos e Carolina Pimentel)