MPF diz que Funai não cumpre atribuições para proteger índios afetados por Belo Monte

07/03/2013 - 18h58

Alex Rodrigues e Pedro Peduzzi
Repórteres da Agência Brasil

Brasília – A Fundação Nacional do Índio (Funai) não está cumprindo como deveria as atribuições que tem para defender os índios que serão prejudicados pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, diz o Ministério Público Federal no Pará. Segundo os procuradores federais, falta à Funai “rigor” para cobrar da Norte Energia, empresa responsável pela construção e operação da usina, o cumprimento de diversas condicionantes.

O MPF informa ter constatado, na regional da Funai em Altamira (PA), um “ambiente caótico, sujo, sem condições dignas para os servidores e para os indígenas”. De acordo com o Ministério Público, tal situação compromete o atendimento aos índios da região. Em nota, o MPF informa que a licença de instalação concedida à Norte Energia estabelecia que o empreendimento só teria viabilidade se houvesse “maciço e imediato investimento governamental” com a contribuição do empreendedor para o fortalecimento institucional da Funai.

Após receber a licença, a Norte Energia assinou termo de compromisso com a Funai prevendo o fortalecimento institucional do órgão indigenista. Isso incluiria, segundo o MPF, a construção de uma nova sede da fundação em Altamira, a contratação de equipe técnica, doação de equipamentos, material de consumo e prestação de serviços de manutenção. O compromisso expirou no ano passado, com execução apenas parcial. A nova sede ainda não ficou pronta.

Diante desse cenário e da falta de retorno da Funai, os procuradores deram prazo de até 20 dias para que a presidenta da fundação, Marta Azevedo, tome medidas para resolver a situação. Entre as recomendações feitas pelo MPF está a adoção de “medidas adequadas e necessárias para exigir da Norte Energia o cumprimento imediato” das condicionantes. O Ministério Público também pede um relatório detalhado sobre a demanda excedente da Coordenação Regional Centro-Leste do Pará, gerada pela construção da Usina de Belo Monte.

Consultada pela Agência Brasil, a Norte Energia informou não ter recebido qualquer manifestação do Ministério Público ou da Funai, e que ainda aguarda isso para se manifestar sobre o assunto. A Agência Brasil entrou em contato também com a Funai, em Brasília, e recebeu mensagem por e-mail na qual a entidade diz que, embora já tenha tomado conhecimento das recomendações do MPF, não vai se manifestar por enquanto. A Regional Centro-Leste da Funai não respondeu às ligações feitas pela reportagem.

A obra da usina também é criticada por parlamentares, mas por causa de outros problemas sociais. Ontem (6), o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas, deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA), criticou o que classificou de “conivência” do Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM) com a existência de prostíbulos próximo ao canteiro de obras. Há poucas semanas uma operação conjunta das polícias Militar e Civil do Pará libertou 16 mulheres, uma adolescente e uma travesti mantidas em cárcere privado e obrigadas a se prostituir.

“Foi desbaratada uma rede de aliciadores, de tráfico humano para fins de exploração sexual de mulheres e adolescentes, dentro do complexo [da usina hidrelétrica] de Belo Monte, algo inadmissível, já que se trata de um projeto que está recebendo financiamento público, do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social]”, disse Jordy, após reunião em que membros da CPI pediram ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o reforço do efetivo da Polícia Federal na região sob influência do empreendimento.

“[Durante diligência no local, na semana passada] tivemos que passar por duas guaritas da empresa para chegar a uma das boates. É muito difícil, eu diria impossível, que eles [os responsáveis locais pelas obras] não tivessem conhecimento do funcionamento desta boate, que fica dentro do canteiro [de obras], em área desapropriada para fins de utilidade pública”, relatou o deputado.

Também ontem, a CPI do Tráfico de Pessoas aprovou a convocação do presidente do consórcio responsável pela construção da usina, José Ailton Lima, para dar explicações sobre o funcionamento da boate no interior do canteiro de obras e sobre a existência de mulheres jovens, incluindo uma menor, no local. O requerimento para que Lima fosse convocado era de autoria de Jordy, que não descarta a hipótese de, descumpridas as condicionantes, pedir o embargo da obra.

“Dependendo das justificativas apresentadas pelo consórcio, vamos avaliar quais procedimentos adotar. Um deles é pedir a suspensão da obra até que as condicionantes sejam cumpridas, o que, aliás, já deveria ter acontecido”, concluiu Jordy.

Segundo o CCBM, a boate citada pelo deputado está em terreno de propriedade particular que nunca pertenceu ao consórcio, localizado a cerca de 15 quilômetros do canteiro. As guaritas a que ele se referiu estão instaladas para controle de equipamento pesado e de ônibus, e qualquer pessoa pode passar por elas. A presença do CCBM na estrada (Travessão 27) deve-se de estarem sendo executadas obras de pavimentação e sinalização no local.

Edição: Nádia Franco

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