Para psiquiatra, atitude isolada não é suficiente para diagnosticar doença mental

09/04/2011 - 13h19

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - O caso do atirador que matou 12 crianças na última quinta-feira (7) na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no Rio de Janeiro, despertou muitas dúvidas sobre as razões que levaram Wellington Menezes de Oliveira a cometer esses crimes. Para o psiquiatra forense do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, Daniel Martins de Barros, essas motivações dificilmente serão conhecidas porque se trata de um caso complexo, que envolve uma conjunção de fatores. Segundo ele, nem mesmo é possível afirmar que Wellington era portador de algum tipo de doença mental.

“Um ato não faz o diagnóstico, por mais estranho e pouco usual que ele seja. Uma atitude isolada não permite se fazer diagnóstico de nada”, disse o psiquiatra, em entrevista à Agência Brasil.

Segundo Barros, existem poucos elementos conhecidos para que seja estabelecido um diagnóstico psiquiátrico do atirador. Nem mesmo a carta deixada por Wellington pode dar pistas sobre a existência de uma possível doença mental. “Ela (carta) tem um conteúdo estranho, mas não se pode dizer que a carta é uma evidência de doença mental”, disse o médico.

“Vou falar com convicção: qualquer pessoa que der um diagnóstico para ele está chutando. Não dá para saber se essa pessoa tinha uma doença só com os elementos que a gente tem. Podemos imaginar que a mãe dele tinha esquizofrenia ou que ele era uma pessoa encimesmada e isolada, com tendência a pensamentos mais fanáticos. Uma hora (essa pessoa) se desequilibra e comete esse ato, possivelmente como vingança a um sistema que lhe fez mal”, afirmou o psiquiatra.

Para Barros, o que é possível dizer sobre o caso é que se trata de um crime com características de vingança. “Existem algumas motivações por trás do assassinato em massa. Crime de vingança é aquele no qual a pessoa tem um histórico naquele lugar, para onde ela volta depois de um tempo e se vinga do sistema que a excluiu ou que a fez mal. Esses crimes são bastante planejados, com antecedência, e não são crimes impulsivos. O que parece ter sido bem a característica desse caso”, afirmou.

Barros ressaltou que, para crimes como esse, não existe prevenção possível. “É difícil a gente planejar ou propor uma medida preventiva para esse tipo de ação porque é muito excepcional. Você não consegue se preparar para algo que é a exceção da exceção."

De acordo com ele, também não é possível afirmar que o atirador tenha cometido esse crime por ter sofrido bullying (tipo de violência física, ou psicológica tal como o assédio moral) na escola. “Não dá para dizer, com certeza, que ele foi vítima de bullying, mas esse tipo de assassinato em massa, dentro de escola, na maioria das vezes é feito por ex-alunos que eram, ali dentro, excluídos, isolados e individualmente maltratados. São dados da literatura universal”, afirmou.  

O que preocupa o psiquiatra com relação a esse caso é a tentativa de atribuir uma doença mental como a grande motivadora do crime, o que pode gerar ainda mais preconceito em relação a pessoas que sofrem com esses  problemas. Segundo Barros, a maioria dos doentes mentais nunca comete crime.

" É importantíssimo ressaltar isso, porque quando acontecem casos como esse e se começa a falar que o acusado podia ser um doente mental, volta aquele velho estigma de que o doente mental é perigoso, que a loucura tem a ver com crime, e isso são preconceitos que precisamos combater. A maioria das pessoas que cometem crimes não têm doença mental. E mais do que isso: a maioria dos doentes mentais é vítima. Não são criminosos”, ressaltou Barros.

O psiquiatra ressaltou que os transtornos mentais são tratáveis à base de remédios ou de terapias específicas e que, na maior parte dos casos, as pessoas que sofrem desse mal não cometem atos violentos. “Se tiver risco delas estarem envolvidas em questões de violência é muito mais provável elas serem vítimas do que criminosas."

Edição: Andréa Quintiere