Festa Literária de Paraty abre espaço para ciência e temas contemporâneos

29/06/2009 - 6h48

Lísia Gusmão
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Em dívida com a poesia, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) começa quarta-feira(1º) e vai homenagear, em sua sétima edição, o poeta pernambucano ManuelBandeira (1886-1968). O único poeta a quem a Flip rendeu homenagem foiVinícius de Moraes (1913-1980) na primeira edição, em 2003. A programação oficial, que inclui 34 romancistas, ficcionistas,historiadores, jornalistas e quadrinistas, promete, além do resgate eda valorização da obra de Bandeira, reflexões sobreciência, religião, política e direitos humanos nas ruas da históricaParaty.  “Fazia tempo que a poesia não tinha destaque na Flip.Entre os poetas, Bandeira é um dos primeiros que aparece”, explicou ocurador da festa, Flavio Moura em entrevista à Agência Brasil. A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) fará a cobertura da Flip com notícias diárias pela TV Brasil, Agência Brasil e Rádio Nacional. O ineditismo é a marca mais forte da sétima edição da festa. Abrindo a programação oficial, na quinta-feira (2), quatro representantes da nova geração discutem a produção de quadrinhos na mesa Novos Traços. “AFlip sempre procura dar destaque a escritores jovens, que ainda não têmcarreira consolidada e em quem aposta. Este ano, o incentivo vai nãoapenas para escritores, mas para quadrinistas novos”, disse Moura.Nomesmo dia, haverá outra atração inédita. No ano em que se completam os 200anos de nascimento de Charles Darwin e os 150 anos de A Origem das Espécies, a Flip receberá, pela primeira vez, um cientista. O biólogonorte-americano Richard Dawkins deve levantar a bandeira do ceticismo na mesa Deus, um Delírio, título de uma de suas obras.Também no campo da não ficção, dois autores chineses vão debater a história recente da China eas restrições às liberdades naquele país. A mesa China no Divã serádividida entre Ma Jian, que relembra o massacre da Praça da PazCelestial, há exatos 20 anos, no livro Pequim em Coma, e a jornalistaXinran, autora de Testemunhas da China, com relatos da revoluçãocultural dos anos 60. “A presença de Ma Jian e Xinran é um dosdestaques, já que a Flip nunca havia recebido autores chineses”,comemora o curador.   Na sexta-feira(3), o jornalismo é o destaque da programação oficial e paralela. Aprofissão de repórter será abordada por Jon Lee Anderson, autor da principal biografia de Che Guevara, que estará na Casa da Cultura. O local queabriga eventos paralelos também receberá o escritor Milton Hatoum, ocrítico literário Francisco Foot Hardman e a professora WalniceNogueira Galvão para uma discussão sobre a obra de Euclides da Cunha(1866-1909), autor de Os Sertões. Ainda sobre jornalismo contemporâneo,o norte-americano Gay Talese participa, no palco oficial da festa, damesa Fama e Anonimato. No mesmo dia, Chico Buarque e MiltonHatoum dão suas visões sobre o Brasil na mesa Seqüências Brasileiras,uma das mais disputadas da Flip. Entusiasta da festa, Chico lançou recentemente Leite Derramado, em que repassa a história doBrasil a partir das memórias do narrador, que, do leito de morte,desfia passagens de apogeu e declínio de sua família por meio de quatrogerações.  No sábado (4),as atenções estarão voltadas para o português António Lobo Antunes,autor de Memória de Elefante, que retrata sua experiência no exércitoportuguês na guerra colonial em Angola.  Lobo Antunes é um dos poucos convidados da Flip com direito à exclusividade no palco.Em vez de dividir a mesa literária, será apenas entrevistado. Este é umdos argumentos do curador Flavio Moura para uma programação maisconcisa, com 34 autores contra 41 em 2008. Moura rebate com umforte argumento as polêmicas e suspeitas lançadas sobre uma programaçãomenor. Antes porém, taxativo, apressa-se em dizer que a criseeconômica não teve nenhuma influência na programação. Ele diz que pode ter havido problemas para captação dosrecursos, mas não houve na formação das mesas. “A crise afeta todo mundo, éuma questão séria. Mas a programação não foi afetada em nada. Ela estáum pouco menor, porque você tem que priorizar o tempo para os autoresfalarem. Sempre que possível, tentei enxugar as mesas ao máximo. Agente quer evitar que o autor viaje para a Flip e tenha pouco tempopara falar com o público”, disse. A crise, por outro lado, develevar à 7ª Flip reflexões sobre valores e princípios que moldaram opensamento ocidental, mas que agora passam por profunda revisão. Aindasob o impacto da chegada do primeiro negro ao poder nos Estados Unidos,o historiador inglês Simon Schamarevisitará a história norte-americana à luz da ascensão do presidenteBarack Obama. Schama estará no domingo (5) na mesa O Futuro da América, título de sua mais recente obra.Flavio Moura reconhece que a presença de historiadores e jornalistas naprogramação da Flip favorece o debate sobre questões sociais epolíticas. “Mas não foi intencional”, assegurou. “A Flip nunca se furtaa discutir temas que estão na agenda do debate. Ela procuranão se pautar unicamente por isso, porque é um evento literário, massempre que é possível trazer esse tipo de discussão para a programação,a gente o faz.”