Caos nos presídios gaúchos provocou 50 mil fugas nos últimos dez anos

11/06/2009 - 15h53

Jorge Wamburg
Enviado Especial
Porto Alegre - Nos últimos dezanos, 50 mil presos fugiram das cadeias do Rio Grande do Sul, que temuma população carcerária de 28 mil detentos. Sóna região metropolitana de Porto Alegre, a média defugas é de 274 presos por mês e os números sãousados pelo governo estadual como novas vagas abertas no sistemaprisional, que tem, na realidade – sem considerar as fugas - umdéficit nos mapas da Justiça de 10.500 vagas noestado (a metade na capital), o que levou os juízes das varas deexecuções penais a decidirem pela prisão apenas de autores de crimes hediondos.Esta situaçãoexplosiva foi revelada em detalhes à Agência Brasil,pelo juiz encarregado da fiscalização dos presídiosda região metropolitana de Porto Alegre, Sidnei Brzuska. Eledisse que o caos é provocado, principalmente, pela falta deinvestimentos do governo estadual na construção depresídios, o que levou os juízes gaúchos, porampla maioria, a decidirem não assinar mandados de prisãoa partir da última segunda-feira (8), a não ser para osautores de crimes como latrocínio, estupro, sequestro,tráfico de drogas e homicídio qualificado.“É como se,aproximadamente, nos últimos dez anos, quase todos os presostivessem fugido duas vezes”, afirmou o juiz Sidnei Brzuska. Alémdisso, acrescenta, os presos da região metropolitana vivem numespaço de 1 metro quadrado para cada um, quando a lei prevêum espaço mínimo de 6 metros quadrados e “em algumas áreas,esse espaço é inferior a 1 metro quadrado (50 ou 70 centímetrospra cada preso)”. Para resolver oproblema da superlotação no Presídio Central dePorto Alegre, por exemplo, seria necessário construir seispenitenciárias com 500 vagas cada uma. Isso porque lávivem 4.800 detentos, quando a capacidade máxima é para1.550. Existem no estado cerca de 90 presídios e quase todosenfrentam problema idêntico, segundo Brizuska, o que levou os 60juízes de execuções criminais a reduzirem asordens de prisão.A quantidade de presoslá amontoados é superior à de 218 municípiosgaúchos e a conta de luz chega a cerca de R$ 500 mil, deacordo com o juiz. A situação é tãodramática que a fuga é necessária para manter osistema, pois se os presos parassem de fugir haveria uma explosãoda população carcerária, diz o magistrado. Sónos primeiros cinco meses do ano, fugiram 1.300 presos, o quecorresponde 62,7% do total de detentos das cadeias gaúchas.Por causa dasuperlotação, os juízes mandaram abrir as portasdas celas em alguns presídios e deixaram os presos viver nasgalerias. “Na região metropolitana, são 7.500 presosnesta situação”, revelou o juiz entrevistado pelaAgência Brasil. Uma situação perigosa, como elereconhece, pois o estado não controla os presos soltos nas galerias,mas apenas a porta do setor e o os corredores. “É o sistemado autocontrole pelos presos, que se auto-organizam, se dividem emfacções, e isso produz uma série de problemasinternos e externos”, disse.Nesse contexto, afirmouo juiz Brzuska, o sistema prisional passou a ser um gerador decriminalidade, quando sua função é justamente ocontrário, isto é, deveria impedir que o crimeocorresse. Por isso, os juízes das varas de execuçõespenais se reuniram e decidiram “fazer uma seleção de quem deveria ir para os presídios”.No Rio Grande do Sul,os presos não ficam em delegacias. Eles têm que serrecolhidos aos presídios por uma norma estabelecida pelaJustiça anos atrás, quando mandou esvaziar as celas dasdelegacias superlotadas. Isso se aplica a qualquer caso de prisãoem flagrante, prisão provisória, prisãopreventiva ou crime hediondo. Tal medida, segundo Sidnei Brzuska,fez com que o Rio Grande do Sul tivesse o melhor sistema prisional dopaís durante muito tempo.Com a atitude dosatuais juízes das varas de execuções penais, nãoserá preso quem praticou um delito leve,respondeu ao processo em liberdade, mas acabou condenado, e não seenvolveu em um novo crime. O mandado de prisão fica engavetado enão será executado pela Justiça “atéque se melhore essa questão das vagas, com o cuidado de nãodeixar cair em prescrição” (vencer o prazo devalidade da condenação).“Essa medida nãoterá um impacto muito grande no sistema prisional eacreditamos que não causará um prejuízo tãogrande à sociedade em matéria de segurança,porque o sujeito está solto e não estápraticando um novo crime. Se voltar a delinquir e for preso emflagrante, será recolhido”, disse o juiz.O magistrado lembrou que uma medidasemelhante foi aplicada anteriormente na comarca de Santa Maria,também no Rio Grande do Sul, mas de maneira radical: aexpedição de mandados de prisão para todo tipo decrime foi suspensa durante certo tempo, o que resultou na reduçãode 20 % no número de presos num período de seismeses. "Que impacto isso terá agora na regiãometropolitana de Porto Alegre é preciso esperar para ver”,afirmou.