Crise: batata quente

16/05/2009 - 8h22

Paulo Machado
Ouvidor Adjunto da EBC
Brasília - A leitora Carina M. R. T. depois de ler a matéria  Comcrise, quadro de melhorias sociais começa a ser revertido, diz FGV,publicada dia 8 de abril, escreveu para esta Ouvidoria dizendo-se interessadaem saber como as diferentes classes sociais são afetadas pela crise financeira. Segundo a notícia, os integrantes das classes A, B e C,distinguidas por seus respectivos níveis de renda, “foram os que sofreram de forma mais intensa os efeitos do agravamentoda crise financeira internacional”, de acordo com um estudo da FundaçãoGetúlio Vargas. Na matéria, o economista responsável pela pesquisa relata omovimento das pessoas entrando e saindo das diferentes classes sociais em umexercício de abstração que dificilmente permite ao leitor chegar a algumaconclusão. Daí a pergunta da leitora.  Para tentar ajudá-la, recomendamos a leitura da CoberturaTemática “Crise: o que fazer  que pode ser acessada através de um selinhona página principal da Agência Brasil.São 27 matérias nas quais a reportagem percorreu algumas cidades-polo dedesenvolvimento em quatro regiões do país. Um esforço para mostrar como a criseestá atingindo diferentes setores da economia em diferentes localidades. Mas aleitora não encontrará nas matérias um corte por classe social e sim por lugar,ocupação e ramo de atividade.  Costurando e dando um sentido menos local e mais amplo àsinformações das outras 26 notícias da Cobertura, aparece uma entrevista comJoão Pedro Stédile, líder do MST. É uma abordagem interessante por serdiferenciada de tudo o que acostumamos a ver em termos de análises macroeconômicasda crise. É a visão daqueles que sofrem os seus efeitos por tabela,indiretamente.  Na matéria Stedile diz que governotem medo de entrar de cabeça no debate sobre crise, o líder dos SemTerra discute as causas e os efeitos da crise, não só para os trabalhadoresrurais, mas também para a população de um modo geral e para a economia do país. Apesar da importância e da representatividade da opinião dolíder camponês, na série de matérias faltou pelo menos um contraponto. Alguém quecontestasse o pensamento de Stédile, como tantos que apareceram durante osúltimos 20 anos nas primeiras páginas e nas colunas de opinião dos jornaisdefendendo a política econômica formulada pelo pensamento neoliberal que noslevou justamente à crise da qual estamos falando. Faltou ainda à Agênciaincluir sob mesmo selo da Cobertura Temática outras duas  entrevistas que contextualizam o assunto econseguem inserir os fatos no processo histórico do sistema capitalista,apontando inclusive as possíveis perspectivas para o momento seguinte, o“depois da crise”. São as entrevistas com Paul Singer Economia solidária pode ser a saída para a crise, afirma Paul Singer, publicadadia 20 de abril e com Ricardo Antunes Criseatual pode ser mais intensa do que a de 1929, diz sociólogo, publicada em25 de abril. Para a mídia em geral, incluindo-se aí a Agência Brasil, a crise ainda é umabatata quente que ninguém sabe exatamente como segurar. Talvez a dificuldade dojornalismo resida no fato de por anos a fio não ter pensado criticamente sobre essesassuntos uma vez que o mercado pregava que em matéria de economia havíamoschegado ao fim da história – o neoliberalismo sempre tirava da cartola umasolução mágica para tudo, sem maiores questionamentos por parte da imprensa. Umadas raras exceções era o jornalismo praticado por Aloísio Biondi(*) em artigos queapontavam as inconsistências e demonstravam as contradições da políticaeconômica. Mas quando um pensamento hegemônicose impõe à sociedade toda crítica a ele é ignorada pelo poder e pela mídia. Aplaca-se adiversidade, elimina-se o contraditório. Deu no que deu... Peço desculpas aos leitores pelo atraso na publicação destacoluna devido a motivos alheios à nossa vontade. Na próxima semana voltaremosao horário normal de publicação. Até lá. (*) ver o pensamento crítico de Aloísio Biondi em http://www.aloysiobiondi.com.br/spip.php?article908