O debate democrático no espaço público de comunicação

10/04/2009 - 9h51

Paulo Machado
Ouvidor Adjunto da EBC
Brasília - No ultimo domingo os bondesde Santa Teresa voltaram às páginas da AgênciaBrasil em três matérias com a opinião de usuários: moradores e turistas, detécnicos do patrimônio histórico e de mecânicos do sistema. O assunto, trazido àOuvidoria por mensagem da leitora e jornalista Juçara Braga, vice-presidente daAssociação de Moradores de Santa Teresa (Amast), foi um dos temas da coluna Assuntos locais e pautas nacionais,publicada em 19 de março. Naquela oportunidade, defendemosque, mesmo em uma pauta que trate de um assunto local, os leitores esperam quea ABr consiga mostrar um olhardiferenciado, evitando as obviedades comumente apresentadas pela mídiacomercial, conseguindo ir além dos fatos, mostrando por que eles aconteceram,suas origens, por que ocorreram de uma determinada maneira e não de outra, osprocessos históricos em curso e suas possíveis conseqüências, quem ainda nãofoi ouvido e precisa ser, para que se estabeleça o debate democrático no espaçopúblico de comunicação. Nas duas matérias publicadasem março a reportagem não havia conseguido diferenciar a abordagem sobre oassunto, noticiando a possível privatização do sistema secular de bondes comoum destino praticamente inevitável, umavez que as autoridades já assim haviam decidido e, de certa maneira, induzindoos leitores a concordar passivamente com o desfecho do caso. Indignada, Jussara, uma das poucasfontes ouvidas naquelas matérias, protestou,dizendo que turistas e moradores não estavam em lados opostos disputandoespaço nos tradicionais bondinhos, mas,sim, que tinham que repartir o poucoespaço disponível nas únicas três composições que ainda funcionavam porque ogoverno havia sucateado o sistema visando  a suaprivatização. Apesar de considerar “improcedente os questionamentos feitos pelaleitora” a Agência Brasil voltouao assunto e aprofundou a questão. O resultado pode ser observado pelosleitores nas matérias Privatização debondinhos divide opiniões em Santa Teresa, Governo quer privatizar bondes commodelo “Frankenstein”, dizem moradores de Santa Teresa e Santa Teresa deve receber neste mês mais um bondinho restaurado. Agindo desta maneira, a ABr dá uma demonstração de como a mídiapode ser útil ao cidadão ao se constituir em um fórum de discussão eargumentação públicos, em que a cidadania encontra espaço para apresentar seusinteresses e seus pontos de vista e reunir informações para deliberarsoberanamente.Nas matérias, o leitor poderá sentir a força de umjornalismo a serviço da cidadania. Entendemos ser esta a função social da mídiade que tanto temos falado em nossas colunas,e nada como exemplos práticos como esse para mostrar o verdadeiro sentido de umjornalismo focado em interesses públicos e republicanos.  O debate sobre o destino dosbondinhos históricos ganha dimensão nacional quando se revelam asquestões humanas, sociais e culturais que permeiam a instituição. Instituiçãosim, pois eles adquiriram o direito de serem tratados como patrimônio vivo da memóriade uma comunidade que luta para preservar sua identidade a despeito do quedizem as planilhas dos burocratas.O jornalismo, ao conseguirreunir em um espaço público os diversos interesses envolvidos na questão,fornece informações para que se aprofunde o debate trazendo à tona significadose valores, inclusive imateriais, muito além de argumentos técnicos, econômicose financeiros dos que vêem ali um simples “sistema urbano de transporte comtarifas subsidiadas”.  Aparecem as contradições,aponta-se as inconsistências inclusive de outros modelos de transporte,revelam-se as posições políticas e ideológicas de autoridades e moradores, e,na vivência desse processo democrático, todos ganham independentemente de quaissejam as soluções a que chegarem. Ao jornalismo, como instrumento a serviço docidadão e da construção da democracia resta o dever cumprido, à agência pública,a lição da importância de ouvir sempre e dar voz aos que não têm o poder formal,e, a esta Ouvidoria, a certeza de que prevaleceu o direito à qualidade da informação.Até a próxima semana.