Lucros maiores e preço baixo em relação a outras drogas estimulam vendas do crack

11/03/2009 - 9h55

Marco Antonio Soalheiro*
Repórter da Agência Brasil
Brasília - "Comcerteza, o crack chegou para destruir. A cocaína dádinheiro, mas não dá tão rápido. Nocrack, o vício é mais rápido. A rapaziada fumouaqui, não volta para casa, vai dar um jeito de pegar mais,até o corpo chegar no limite. O crack dá muito maisdinheiro."Aspalavras de Léo, 29 anos, ex-traficante que atuava em cidadessatélites de Brasília, apontam para um dos principaisfatores do aumento do crack nas grandes e médias cidadesbrasileiras.

Adroga se mostrou, em muitos casos, mais rentável aostraficantes do que a venda de outras mais caras, como a maconha e acocaína refinada. Na região metropolitana de BeloHorizonte, por exemplo, um papelote de cocaína custa cerca deR$ 20, enquanto uma pedra de crack sai em média a R$ 5.

Acaracterística do consumo, entretanto, pode fazer do crack umaoportunidade financeira mais atraente para o vendedor. Um usuáriode cocaína consumiria em uma noite dois ou trêspapelotes. Muitos dependentes do crack que procuram o Centro Mineirode Toxicomania relatam fazer uso médio de 15 a 20 pedras pordia.

"Umúnico usuário de crack gera mais renda do que umusuário de cocaína. O crack gera fissura, dependênciaforte pelo uso continuado. Isso explica também por que asbocas de fumo estão se transformando em grandes revendedorasde crack", diz o coordenador do Centro de Estudos e Pesquisas emSegurança Pública da Pontifícia UniversidadeCatólica de Minas Gerais (PUC Minas), Luís Sapori.

Naprática, o ex-traficante Léo explica essacontabilidade: "Vou te falar a real, na noite, a gente fazia R$1 mil. Só com pedra, pedrinha assim de R$ 10. Dádinheiro para quem está nesse meio, dá dinheiro, R$1 mil de lucro. Se você anunciar que tem crack, neguinho vaibater na sua casa de manhã, à tarde, à noite, demadrugada. Não tem conversa."

Paraos usuários, a busca pelo crack surge como oportunidade deexperimentar algo diferente, mais forte. "O crack veio pormotivação de alguns amigos, que falavam que era maisforte, que dava uma viagem imensa e deixava o cara mais poderoso.Resolvi experimentar e acabei viciando", conta Maurício,31 anos, morador de Brasília e em tratamento há 3 mesespara se livrar do vício de vários anos.

"Oefeito do crack é muito rápido. No Plano [Piloto,região central de Brasília] você compra umapedra a R$ 10, fuma, tem um efeito de 50 segundos, depois vem acompulsão que faz você procurar mais", reforçaGP, 33 anos, também ex-usuário em tratamento. Segundoo psiquiatra Félix Kessler, coordenador de pesquisas sobreálcool e drogas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul(UFRGS), o crack é uma droga muito potente e provoca efeitosmais fortes do que o álcool e a maconha em crianças,jovens e adolescentes. “Drogas fumadas entram no organismorapidamente. O pulmão tem superfície extensa queabsorve grande quantidade de substância, que vai direto aocérebro", assinala Kessler.

JoséLuiz Ratton, que coordena o Núcleo de Pesquisas emCriminalidade, Violência e Políticas Públicas deSegurança da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), lembraque o mercado consumidor do crack, focado nas classes C, D e E, énaturalmente mais amplo do que o da cocaína. O fato de ser umadroga barata permite maior acesso e maior quantidade de uso.

Psiquiatrastambém têm relatado que a droga conquista adeptos nasclasses A e B em ritmo crescente. Além disso, a estruturaexigida para a venda é mais simples. "Ele [o crack]pega todas as classes sociais com capilaridade. O ganho nãoestá restrito ao nicho da classe média, como a cocaína.Tem uma base consumidora maior e é mais barato. As perdas sãomenores no estoque e na logística de transporte. O mercado émais pulverizado e fragmentado. É um grande varejo de camelôsde droga, com produção artesanal", descreveRatton.