Relatório traz detalhes do assassinato de Dorothy Stang

17/04/2006 - 16h38

Alessandra Bastos
Enviada especial

Eldorado de Carajás (PA) – Mostrado à Agência Brasil pelo chefe da Divisão de Investigações e Operações Especiais (DIOE), delegado Waldir Freire, o relatório das investigações da morte da missionária Dorothy Stang. Veja, abaixo, os principais trechos:

"A freira havia se deslocado à área do PDS [Projeto de Desenvolvimento Sustentável] no dia anterior ao crime com o objetivo de se reunir com os agricultores para tratar de assuntos relacionados aos rumos do projeto. Eles discutiram, entre outros temas, sobre as divergências existentes com fazendeiros e outros ocupantes não assentados no projeto, os quais se opunham a essa forma de ocupação da terra".

"Ela foi a um determinado lote, localizado a aproximadamente 150 metros da margem da vicinal que atravessa o PDS, para falar com as pessoas que ali se encontravam. Entre elas, Amair Feijoli da Cunha, vulgo Tato; Clodoaldo Carlos Batista, vulgo Eduardo, e Rayfran das Neves Sales, vulgo Fogoió".

"Ao chegar ao local, Dorothy Stang informou aos presentes que aquela área estava sub-judice e, em face desta condição, sugeriu que ali não fosse construída qualquer benfeitoria como pretendia Amair Feijoli da Cunha, que se dizia proprietário da terra. Amair começou a se alterar no momento em que a freira disse que os associados do PDS haviam decidido construir ali a sede da entidade encarregada da coordenação do projeto".

"Tato reagiu dizendo – em tom bastante grosseiro – que naquela área ninguém entraria e que, caso contrário, ‘poderiam se preparar para carregar corpo de peão nas costas...’ proferindo, em seguida, uma série de palavrões dirigidos à irmã. (...) Tudo leva a crer que o acontecimento era apenas o que faltava para definir a sentença de morte dela".

"Naquela mesma noite [sexta-feira], o pistoleiro Rayfran das Neves Sales, acompanhado de Clodoaldo Carlos Batista, foi ao barraco onde Dorothy dormiu para matá-la, mas só não o fez em virtude de não encontrá-la na moradia".

Inconformado, Rayfran, acompanhado de Eduardo, caminhou por cerca de duzentos metros naquela mesma noite até a frente do barraco do agricultor chamado João, pois ali possivelmente a vítima poderia ser encontrada. Todavia novamente não pôde consumar seu intento, porque havia uma lâmpada que iluminava a área em frente à casa, inviabilizando a consumação do delito naquele momento. Se o crime tivesse de ser executado naquele local, logo alguém poderia reconhecê-lo, embora já existisse uma rota de fuga previamente definida, com destino ao barraco de Tato. Diante dessa impossibilidade, mais uma vez o plano de execução de Dorothy fora adiado, mas não por muito tempo".

No início da manhã seguinte (sábado, dia 12 de fevereiro de 2005), Rayfran e Clodoaldo já estavam espreitando a vítima nas imediações do barraco em que ela passara a noite, a fim de esperar a melhor ocasião para assassiná-la. A espera não demorou muito. Por volta de 7h30, os dois avistaram a vítima de conversa com um homem identificado apenas pelo apelido de "Maranhão". Ao afastar-se de seu interlocutor, a vítima encontrou-se com os dois criminosos e passou a reafirmar tudo o que havia lhes dito no dia anterior, ou seja, que a área, de fato, pertencia aos agricultores, inclusive, mostrou-lhes o mapa da gleba, cuja propriedade é alvo de discussão.

"Diante da insolência de Raifran, Dorothy pegou a Bíblia que costumava carregar na bolsa e passou a ler alguns versículos do livro de Mateus, mas o assassino não lhe deu ouvidos. As últimas palavras que o criminoso dirigiu à vítima foram as seguintes: Se a senhora não resolveu este problema até agora, então não vai resolver mais."

"Neste momento, a vítima encontrava-se virada de costas para o assassino. Este a chamou, fazendo-a ficar de frente, e efetuou o primeiro de uma série de seis disparos, o qual atingiu inicialmente o abdome da religiosa. Ao cair de bruços, Dorothy Stang recebeu mais cinco tiros nas costas e na cabeça disparados à curta distância. O laudo da necropsia, inserido nos autos, revelou a forma como a missionária foi morta".

"Enquanto isso, Clodoaldo assistia a tudo sentando em um garote de combustível. Em seguida, ele deu o sinal, através de um gesto, para o momento exato da execução, no que foi atendido por Raifran das Neves Sales".

"Consumado o crime, os dois saíram correndo pela mata rumo à fazenda de Vitalmiro Bastos de Moura, vulgo Bida. A propriedade fica a cerca de cinco quilômetros de distância do local do crime. Os criminosos permaneceram ali até o dia seguinte (domingo), quando continuaram a empreender fuga pela mata até serem capturados pela Polícia. Raifran Sales foi preso no início da noite de domingo (20.02.05) e Clodoaldo Carlos Batista foi capturado na noite do dia seguinte, segunda-feira (21.02.05)".