Agentes da reforma agrária avaliam o que mudou dez anos depois do Massacre dos Carajás

17/04/2006 - 9h35

Alessandra Bastos
Enviada especial

Eldorado dos Carajás (PA) – A Agência Brasil convidou quatro agentes da reforma agrária no Pará para avaliar o que mudou, dez anos após o conflito que ficou conhecido como "Massacre de Eldorado dos Carajás", quando 19 sem-terras foram mortos pela Polícia Militar no município paraense.

Foram ouvidos o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Pará, Ulisses Manacás; o coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Pará, Jax Nildo Aragão Pinto; o superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) do Pará, Cristiano Martins, e de Santarém, Pedro Aquino, e o chefe da polícia civil metropolitana, delegado Pedro Aquino.

Para o coordenador do MST, houve mais retrocessos que avanços."Os autores da violência se profissionalizaram e criaram milícias armadas, se oficializou os crimes no campo. Todos os grandes fazendeiros têm milícias armadas com participação de policiais". Nesses dez anos, 163 lideranças foram assassinadas no Pará. No ano do massacre, foram assassinados 33 trabalhadores. Esta estatística se repetiu em 2003.

Ulisses Manacás diz que as conseqüências são negativas. "Temos mais de 30 milhões de hectares de terras griladas, só perde para o Amazonas, que tem 55 milhões. Esse quadro faz com que a violência continue". E que Massacre inicia demarca uma nova fase de violência. "Até então quem matava trabalhador era pistoleiro, marca a atuação da polícia também assassinando. A força do Estado eliminando trabalhadores".

Para o MST, o processo de reforma agrária também não avançou. "Não houve alteração nas políticas. Não tem novas linhas de crédito e seguro-agrícola, garantido em qualquer país", reclama. Ele afirma que os créditos existentes "são muito burocrático, pouquíssimos trabalhadores conseguem porque é exigido uma quantidade de terra limite e a propriedade tem que ser individual e os assentamentos são coletivos".

Outra dificuldade é que o "governo passado tentou mercantilizar a reforma agrária, retirando a responsabilidade do Incra de desapropriação e passando para estados e municípios, que têm que comprar a terra".

O coordenador estadual da CPT concorda que é difícil conseguir empréstimo pelas linhas de crédito do Estado. Jax Pinto não aprova o modelo de reforma adotado pelo Brasil, no qual o grileiro "vende para o Estado terra que era do próprio Estado".

Para o superintendente do Incra em Belém, na época do Massacre o governo "não deu uma resposta significativa no processo de reforma agrária. Isso fez as coisas se acirrarem, mas o conflito, apesar de toda a gravidade, contribuiu para o avanço da reforma".

Ele acredita, inclusive, que o assassinato da irmã Dorothy Stang foi uma "reação dos grileiros ao que o governo já estava de fazendo com a criação dos Planos de Assentamento". A superintendência do Incra em Santarém foi criada, no ano passado, após o assassinato da missionária. "A superintendência foi uma reivindicação do movimento social", diz o superintendente do Incra em Santarém, Pedro Aquino. Em 2005, 18 mil famílias foram assentadas pela superintendência.

O diretor da Polícia Civil metropolitana, delegado Ruy Romão, diz que, no Pará, poucas são as ações diretas. "Essa ausência do Estado faz com que ocorram esses crimes". Sobre as conseqüências do massacre no trabalho da polícia, ele afirma que "toda atividade humana, todo dia se aprimora".