Relatório da Conferência sobre Bioversidade mostra avanços em temas relevantes para o Brasil

01/04/2006 - 12h16

Lúcia Nórcio
Repórter da Agência Brasil

Curitiba - A 8ª Conferência da Partes (COP-8) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) terminou nessa sexta-feira (31) com avanços na discussão de temas considerados relevantes para o Brasil. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, apresentou relatório sobre as decisões do encontro. A construção do Regime Internacional de Acesso e Repartição de Benefícios foi um dos principais assuntos discutidos.

Os quatro mil delegados participantes do encontro decidiram adotar o texto apresentado em fevereiro na Espanha pelo grupo de trabalho permanente sobre o tema. Ficou estabelecido o ano de 2010 como teto para a conclusão dos trabalhos. Nesse período, as negociações vão continuar e serão realizadas duas reuniões antes da COP-9, marcada para daqui a dois anos na Alemanha. Um grupo composto de 25 especialistas e sete observadores será criado para elaborar opções para certificados de origem e procedência legal relacionados aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados. A idéia é que esse certificado seja emitido pelo país de origem e garanta o respeito às leis nacionais.

Os países foram convidados a aumentar o número de representantes de comunidades indígenas e locais em suas delegações oficiais e a encontrar fórmulas de efetiva participação desses povos nas decisões da CDB. Os delegados decidiram criar um fundo voluntário para garantir essa participação, não apenas na construção do regime, mas em todas as discussões relacionadas ao conhecimento tradicional. Nesse item, foram definidas diretrizes para orientar o desenvolvimento de um sistema sui generis de proteção ao conhecimento tradicional, bem como linhas para um código de conduta que assegure o respeito à herança cultural e intelectual desses povos.

Ficou decida, na área de biodiversidade agrícola, a manutenção da moratória imposta às sementes com Tecnologias Genéticas de Restrição de Uso (GURTS), também conhecidas como "terminators" ou estéreis. Prevalece o texto original da CDB, que baniu experimentos em campo e a comercialização desses produtos. Os delegados optaram por promover e disseminar pesquisas sobre o impacto das sementes e reafirmaram a decisão de respeitar o conhecimento e as práticas tradicionais dos agricultores. Eles também decidiram nortear os países na implementação de ações transversais ligadas à biodiversidade, alimentação e nutrição.

Pela primeira vez, foi feito um esforço para engajar o setor privado na implementação da convenção. O Brasil, por meio do Ministério do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CBEDS), liderou essa iniciativa, em parceria com o Reino Unido e com a União Mundial para Conservação da Natureza (IUCN). A iniciativa foi referendada e o setor conclamado a alinhar suas políticas e práticas aos objetivos e metas da CDB.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, alertou para o fato de que a maior parte das decisões possui o caráter de transversalidade (modos de se trabalhar o conhecimento): a que trata da promoção de sinergias entre biodiversidade e alimentação e nutrição; a que trata das tecnologias genéticas de restrição de uso, a de encorajar as partes a respeitar o conhecimento e práticas tradicionais de agricultores; a que trata das árvores transgênicas, que reconheceu as incertezas quanto aos seus impactos ambientais e socioeconômicos potenciais e reafirmou a necessidade de uma abordagem cuidadosa quanto à questão.

Em seu relatório, a COP-8 afirma ter avançado em relação a outras COPs, na tentativa de fazer com que o segmento ministerial deixasse de ser apenas uma reunião de ministros do Meio Ambiente, bastante distanciada do que acontece nas mesas de negociação, para ser um debate que reflita a variedade de setores e de atores participantes das negociações oficiais. A idéia é reforçar a participação em alto nível de mais setores e fazer com que esses debates possam influenciar de maneira mais qualificada as negociações da conferência.

Decidiu-se, também, que é preciso agir mais rapidamente em todos os níveis para alcançar os objetivos da convenção e a necessidade de garantir financiamento duradouro para a sua implementação.

O relatório conclui que os indicadores atuais de perda da biodiversidade são extremamente preocupantes e que não se pode continuar a postergar as medidas necessárias. "O compromisso assumido em Curitiba é mais do que uns com os outros, é com a vida na terra. Precisamos dar mostras disso aos cidadãos que nos dão o mandato para estarmos aqui reunidos e, em nome deles, discutirmos o tipo de planeta que legaremos às gerações futuras", afirmam no relatório os delegados participantes da conferência.