Convivência entre militares e indígenas na fronteira nem sempre é harmoniosa

18/01/2006 - 15h33

Thaís Brianezi
Repórter da Agência Brasil

Manaus – Na fronteira do Brasil e outros países amazônicos convivem militares e povos indígenas em uma relação nem sempre harmônica. "Temos questionado a forma como o Exército tem se imposto, desrespeitando nossos territórios milenares", disse o coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Jecinaldo Sateré-Mawé.

Além das críticas ao uso do território indígena, há relatos de discriminação. Maria Gonçalves, da etnia Tariano, moradora distrito de Iauaretê, em São Gabriel da Cachoeira (AM), no Alto Rio Negro, na fronteira com a Colômbia, diz que "há muita humilhação dos oficiais indígenas. Mesmo tendo o segundo grau completo, dificilmente conseguem virar cabos", afirmou.

Maria Gonçalves e Enerstina Alves (que é da etnia Dessano e também mora em Iauaretê) contaram que antigamente parte dos soldados se envolvia com muitas jovens e depois desapareciam quando elas engravidavam. Hoje já é diferente, conta. "Os militares quase todos vivem lá com suas famílias. Quando um soldado faz arruaça, os indígenas reclamam e ele é transferido", ressaltou Gonçalves.

De acordo com o chefe de Estado Maior do Comando Militar da Amazônia (CMA), general Villas Boas, o Exército é "bastante rígido com normas, mas não podemos retroceder à Idade Média e impedir que dois jovens namorem". Ele disse que quase todos os 27 pelotões de fronteira amazônicos estão sediados em áreas indígenas. "Se você pegar a foto de um pelotão, você não consegue distinguir quem é indígena e quem é soldado. Porque os índios também são brasileiros, também entram para o Exército e formam a maior parte dos cabos e soldados que atuam na região", ponderou o general.

O general também defendeu a presença militar em reservas étnicas, já que, segundo ele, contribui para impedir as invasões do território e, conseqüentemente, proteger a cultura dos povos indígenas.

"Na terra Yanomami há três pelotões de fronteira: Auari, Surucucu e Maturacá. Nessas áreas você não tem garimpo ilegal, extração ilegal de madeira, biopirataria ou contrabando", exemplificou o general. "Além disso, a presença do índio facilita a atuação do Exército, pela vinculação dele com o território, seu conhecimento da região".

De acordo com dados do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e do Coiab, cerca de 430 mil índios vivem na Amazônia Brasileira e representam 60% da população indígena do país.