Nova presidente vai enfrentar desafios no Chile, avalia cientista político

16/01/2006 - 20h11

Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil

Brasília – A eleição da socialista Michelle Bachelet como presidente do Chile representa a consolidação da democracia na América do Sul na opinião do cientista político José Flávio Saraiva, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB). Apesar de vencer pela aliança de centro-esquerda que já governa o país desde 1990, Bachelet diferencia-se por seu passado de perseguição política – seu pai foi torturado e morto pelo regime de Augusto Pinochet (1973-1990). "Isso tem um impacto para todos nós e para a própria projeção internacional da América Latina nos foros internacionais, junto à Europa, aos Estados Unidos e a outras partes do mundo", avalia Saraiva.

Responder às demandas da sociedade civil será um dos desafios de Bachelet. O cientista político destaca que o Chile avançou na estabilização e na internacionalização de sua economia, mas "regride em termos sociais". "É um país cujos dados relativos à distribuição da renda e à capacidade de ampliação do mercado de trabalho vêm sendo uma preocupação por gente das lideranças chilenas", diz.

A situação é resultado daquilo que Saraiva chamada de um "socialismo neoliberal". "É a opção chilena por uma inserção internacional pela via da liberalização, de uma grande integração ao mercado internacional, de privatizações estruturantes, ou desestruturante como se queira analisar", explica o professor. Por outro lado, representa a opção por um programa de reformas muito tímido no campo das políticas compensatórias sociais. "Há uma preocupação de que o Chile esteja apenas estabilizando-se na mediocridade, mantendo e ampliando a desigualdade social e talvez reproduzindo o modelo venezuelano dos anos 50, 60 e 70",

Na sua avaliação, o socialismo da nova presidente chilena sequer enfrenta ideologicamente heranças da política econômica da ditadura. "É um socialismo muito leve porque pratica políticas econômicas e sociais do Consenso de Washington", acredita. "Um socialismo bastante distinto daquele professado pelo vizinho, o presidente da Bolívia recém eleito [Evo Morales], daquele mais ao norte da América do Sul professado de forma mais nacionalista e em tons anti-americanos como o de Hugo Chávez e também um pouco diferente da concepção do partido hegemônico aqui na aliança de poder no Brasil", opina.

O cientista político acredita que a América do Sul vive uma "onda de reação" aos governos neo-liberais que implementaram, nos anos 90, políticas de privatização, abertura econômica e desregulamentação do mundo do trabalho. "No entanto, a reação do eleitorado a essa formulação política varreu e continua varrendo a América do Sul para votos que vão mais para o campo de centro-esquerda", destaca.