Reportagens especiais detalham a cultura da soja, o carro-chefe da agricultura brasileira

15/01/2006 - 18h15

Eduardo Mamcasz
Repórter da Rádio Nacional

Brasília - Quase a metade da área que acaba de ser plantada na atual safra brasileira de soja é da espécie transgênica, uma novidade no agronegócio que, por sua vez, vende 84% da colheita a apenas quatro empresas multinacionais, que ditam as regras em todas as fases do processo. Por se tratar de uma atividade de risco, devido à oscilação dos preços que, neste ano continuarão baixos no mercado internacional, o governo tem desestimulado os agricultores familiares a continuarem na monocultura da soja.

Estes são alguns dos aspectos que serão debatidos, a partir desta segunda-feira (16) na série de seis reportagens especiais que serão transmitidas na programação da Rádio Nacional (Brasília, Rio de Janeiro e Amazônia), com o áudio disponibilizado aqui na Agência Brasil. Serão mostradas as inúmeras entrevistas – com diferentes pontos de vista sobre o mesmo assunto – que foram feitas durante a realização do rádio-documentário "Soja, um grande negócio", envolvendo ambientalistas, produtores e governo.

A primeira reportagem tratará justamente da discussão sobre os impactos ambientais que o cultivo da soja tem provocado no Brasil desde a sua chegada, há 40 anos, no Rio Grande do Sul, até a invasão que ela promove, nos dias de hoje, nas terras da Amazônia, nossa última fronteira agrícola. Outra denúncia feita é sobre a devastação provocada pela soja na área de cerrado brasileiro que, segundo o cientista Charles Clement, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) "foi o maior crime dos últimos 20 anos".

A segunda reportagem da série "Soja, um grande conflito" preocupa-se em procurar algumas soluções que estão sendo apresentadas para evitar que a monocultura continue provocando impactos ambientais. Uma delas foi criada pelo Grupo Articulação Soja, com ramificação na Europa e na Ásia, onde exerce pressão em cima dos compradores de soja brasileira para que só comprem de produtores que tenham a certificação ambiental voluntária. Segundo os produtores rurais ouvidos, a proposta provoca aumento de custos de produção. "Até parece-nos ser a favor do interesse internacionais que não os do Brasil", lastima-se o presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul, Carlos Speroto.

Em compensação, ao discutir os impactos sociais - tema da terceira reportagem - o representante gaúcho aceita que os pequenos agricultores se arriscam muito ao entrar na monocultura da soja. Tanto que o secretário de agricultura familiar do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Valter Bianchini, garante que o Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) não dará mais financiamento aos que insistirem no plantio de um só produto.

Uma das causas dos pequenos agricultores serem aconselhados a se afastarem da monocultura da soja está na quarta reportagem da série. É a dependência que tanto pequenos quanto grandes produtores rurais brasileiros envolvidos no cultivo da soja têm junto a quatro empresas multinacionais. Segundo o chefe do Departamento de Assuntos Internacionais e Comércio Exterior da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), Antonio Donizeti Beraldo, elas compram 84% de toda a soja colhida no Brasil. "Essa excessiva concentração é um fator que afeta, sem dúvida nenhuma, a rentabilidade da produção, porque há uma tendência das grandes fixarem os preços", garante.

Esta mesma dependência ele diz existir no caso da soja geneticamente transformada, a transgênica, assunto que será analisado na quinta reportagem. O problema se agrava neste ano a partir da informação dada pelo presidente da Associação Brasileira de Pesquisa de Obtentores Vegetais (ABPOV), Rui Carraro, sobre a quantidade de soja transgênica plantada neste ano. "A média é de 40% a 50%,com perspectiva de crescimento para o próximo ano porque a tecnologia realmente facilita", afirma Carraro. Para desespero do coordenador de campanha de Engenharia Genética do Greenpeace, Ventura Barbeiro, que lembra o que costuma chamar de "a tragédia ecológica" que foi a soja transgênica nos Estados Unidos, quando começou, em 1996.

A sexta reportagem da série "Soja, um grande negócio" vai tratar da discussão aberta na última fronteira onde o produto está querendo chegar, que é o Amapá, depois de ter-se firmado no Mato Grosso e Rondônia e Roraima, entre outros estados da Amazônia.

A matéria discute os aspectos legais da terra, pertencente em sua maioria à União Federal, e outras necessidades básicas. Uma delas será citada pelo agrônomo Emê Botelho, que trabalha na Embrapa da Amazônia Ocidental há mais de 30 anos e acompanha o assunto. "A coisa mais importante para conter este avanço acelerado da soja na Amazônia seria basicamente o zoneamento ecológico para que a gente possa dirigir o que é, o que deve ser, como, onde, com que e por quem", conclui.