Em nota, ministério argumenta que jornal inglês fez "acusação leviana" sobre pecuária brasileira

06/01/2006 - 18h40

Lana Cristina
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento divulgou hoje (6) nota oficial classificando como leviana a reportagem do jornal inglês Daily Telegraph que acusa o Brasil de exportar para a Grã-Bretanha carne proveniente de fazendas que usam trabalho escravo. "Trata-se de uma acusação leviana e reflete mais uma vez o protecionismo agrícola de países incomodados com a expansão do agronegócio brasileiro".

A reportagem, com o título "Carne barata brasileira é subsidiada por trabalho escravo", foi reproduzida ontem (5) no site da BBC Brasil. Nela, há apenas o relato do autor de um estudo, que teria visitado fazendas brasileiras para avaliar as condições sociais da produção de carne e das crescentes exportações de carne do Brasil que, segundo o jornal, estão prejudicando os preços mundiais. O fazendeiro escocês David Ismail é o autor da pesquisa, financiada pela organização Nuffield Foundation.

O Ministério da Agricultura não nega, na nota, o uso de trabalho escravo nas fazendas de produção pecuária no país e reafirma que o governo está permanentemente preocupado em combater o trabalho escravo. O ministério cita relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que reconhece o programa brasileiro de combate ao trabalho escravo como o que mais avançou no mundo na erradicação desse tipo de crime. "Afirmar que a carne brasileira seria barata por conta de suposto trabalho escravo não tem a menor correspondência no cenário agrícola brasileiro", afirma a nota.

Na visão do Ministério da Agricultura, as afirmações que constam na reportagem do jornal britânico têm caráter protecionista, ou seja, teriam a intenção de provocar uma reação comercial à carne brasileira, competitiva no mercado internacional, segundo os técnicos, em função da tecnologia e manejo usados na criação do gado. "É competitiva (a pecuária brasileira) por causa da tecnologia disponível e da capacidade do produtor brasileiro."

O ministério argumenta ainda que o boi brasileiro é criado no pasto, é orgânico e não se alimenta de ração à base de farinha de carne, como é o caso do gado europeu. "A pecuária aqui utiliza mão-de-obra especializada e ainda é beneficiada pela riqueza natural e pela criação extensiva".

Na nota, o ministério termina ressaltando que a maior parte do rebanho bovino nacional e dos frigoríficos que exportam é da região Centro-Sul. As regiões Norte e Nordeste não exportam. Isso porque a reportagem do Daily Telegraph informa que o relatório de Ismail diz que "nas remotas áreas onde a floresta do Brasil está sendo cortada para dar lugar à criação de gado, ele [o fazendeiro] encontrou encontrou condições entre os trabalhadores sem-teto e seus empregados semelhantes às piores cenas do apartheid", sugerindo que a carne exportada pelo Brasil viria de regiões como a Amazônia.

O fazendeiro afirmou ao jornal britânico que sua conclusão é de que há uma relação entre escravidão, uso de áreas de floresta e a carne que entra na Grã-Bretanha.

De acordo com a lista suja das propriedades em que a secretaria de Inspeção do Trabalho (do Ministério do Trabalho) encontrou trabalhadores em condições semelhantes à escravidão, 137 empresas foram notificadas até a segunda-feira (2). A lista é atualizada a cada seis meses e, dela, foram excluídas provisoriamente 22 empresas que conseguiram ficar de fora do cadastro por liminares obtidas na Justiça.

O ministério divulga na lista o nome do proprietário, o cadastro de pessoa física ou jurídica (CPF ou CNPJ), o estado onde fica a propriedade, o número de trabalhadores libertados e a data em que a propriedade entrou na lista. Não há, no entanto, referências sobre a atividade dos empresários. E não é possível avaliar o peso da atividade pecuária nas notificações do ministério apenas pela verificação da lista suja do trabalho escravo.

Nas ações dos fiscais do trabalho, já foram libertados mais de 17 mil trabalhadores da escravidão, de 1995 a 2005. Desses, 12,4 mil foram libertados nos últimos três anos.