Serviço de C&T/1

23/08/2002 - 8h23

Confirmada a ocorrência natural de pérolas na ilha do Marajó

Em artigo científico geólogos destacam o potencial da região em produção de pérolas cultivadas

Brasília, 23 (Agência Brasil - ABr) - É possível que alguma mulher ostente no pescoço um colar de pérolas da água doce que banha a porção sul da ilha do Marajó. Enquanto a existência da jóia não passa de uma probabilidade, a presença de ostras que produzem uma das pedras mais cobiçadas pelo público feminino foi confirmada por pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) que estudaram peças de uma coleção particular. As ostras que as produziram foram retiradas da baía de Marajó, na confluência dos rios Tocantins e Pará.

Chamadas de ostras perlíferas, esses moluscos só produzem pérolas em condições de salinidade e temperatura muito especiais. A água tem que ser límpida e livre de predadores, segundo relata o geólogo, especializado em mineralogia, Marcondes Lima da Costa. Ele e o colega Helmut Hohn, que hoje está em Santa Catarina, publicaram, no início do ano, trabalho científico de análise de 12 pérolas, emprestadas pela professora Terezinha da Silva, na revista de geologia Rem (Revista Escola de Minas). O Brasil, de acordo com Costa, é um país de potencial para a produção de ostras perlíferas cultivadas. "Afinal, temos condições tropicais favoráveis", observa.

Há relatos de "fazendas" de criação de ostras perlíferas em Santa Catarina, ainda não confirmados por Costa. O fato de ser uma produção desconhecida do ponto de vista mercadológico talvez revele uma atividade ainda insipiente. Em Marajó, tampouco há cultivo oficial de ostras para produção de pérolas. Mas sabe-se que alguns ribeirinhos comercializam conchas clandestinamente, em Belém, já que necessitariam de licença ambiental para exploração do molusco.

O objetivo da publicação dos dois pesquisadores, aliás, foi justamente o de chamar a atenção para o potencial da baía de Marajó para o cultivo de pérolas. O governo do Pará lançou o programa Polo Joalheiro há cerca de três anos, no intuito de fomentar a atividade praticamente inexistente no estado e, com isso, gerar emprego e renda. O Pará tem tradição mineral, com significativa produção de ouro e extração de pedras preciosas, como ametista e topázio, e o pólo viria a preencher uma lacuna de mercado. As instalações do pólo, sediado num prédio histórico de Belém, serão inauguradas em setembro.

Com artesãos produzindo jóias, haverá demanda e, conseqüentemente, a necessidade por matéria-prima. "Sempre haverá pedra quando houver interesse comercial", analisa Costa. Na sua opinião, o cultivo de pérolas poderia se tornar promissor para a população ribeirinha do estado. Ele lembra a tradição de países produtores de jóias que sequer extraem minerais e pedras preciosas, como a Índia e a Itália. Respectivamente, os dois países consomem anualmente 600 e 500 toneladas de ouro para confeccionar adornos e outras peças nobres.

Dados do artigo publicado na Rem comprovam a rentabilidade do negócio. De 1992 a 1996, o comércio internacional de pérolas movimentou US$ 3,7 bilhões. As pérolas cultivadas responderam por praticamente 90% do total da produção, no mesmo período. Os países asiáticos forneceram 96% do total dessas pedras. Japão e China são os maiores produtores de pérolas cultivadas. (Lana Cristina)

Oceano Atlântico influencia na presença de ostras na ilha do Marajó

Essa pode ser a primeira região brasileira a registrar pérolas naturais, por isso recomenda-se estudos mais aprofundados sobre os moluscos da região

Brasília, 23 (Agência Brasil - ABr) - A ocorrência natural de pérolas no rio Pará pode se explicar pela influência, num passado geológico recente, das águas do Oceano Atlântico, deixando a área ainda sob efeito das marés. Conforme o artigo assinado pelos geólogos Helmut Hohn e Marcondes da Costa Lima, da Universidade Federal do Pará (UFPA), Marajó pode ser a primeira região brasileira, em nível de importância, com ocorrência de pérolas naturais, o que, em si, já abre perspectivas para produção de pérolas cultivadas.

Eles recomendam, no artigo da Revista Escosla de Minas (Rem), estudos mais aprofundados sobre os moluscos da baía do Marajó para elucidar algumas dúvidas. Uma delas é por que as ostras da região sul da ilha desenvolvem uma concha tão espessa. O estudo que deu origem ao trabalho científico foi realizado há três anos e incluiu trabalhos de campo e de laboratório. Eles não chegaram a coletar amostras de pérolas, apenas de conchas e conversaram com pescadores e moradores da região para verificar a veracidade de histórias conhecidas sobre a ocorrência de ostras perlíferas no rio.

Em laboratório, submeteram as conchas coletadas e as pérolas da coleção da professora Terezinha da Silva à radiação ultra-violeta para determinar a cor com que o material respondia aos raios. A parte interna da concha apresentou cor azul fraca quando irradiada por UV de onda curta e de onda longa. Um detalhe vantajoso apontado por Costa foi a camada espessa de conchiolina das conchas, o que lhes confere qualidade de madrepérola. "Como o próprio nome diz, é a mãe da pérola. Muitos artesãos usam o material para confeccionar bijuterias e jóias", observa o geólogo. Já as cores das pérolas variaram do branco rosa ao cinza escuro. Hohn e Costa concluíram que as pérolas não são de boa qualidade e é provável que se houver pérolas em algum molusco na baía de Marajó, o padrão seja o mesmo. As pérolas analisadas pertencem à família da professora há alguns anos. Mas há relatos, atuais, de moradores que encontraram pérolas casualmente, ao comer o molusco.

No entanto, Costa acredita no potencial perlífero da baía de Marajó, justamente pela influência marítima que os rios Pará e Tocantins sofrem. "O sal ajuda a formar o carbonato de cálcio, essencial para a formação dos dois componentes que formam a pérola, a aragonita e a conchiolina", explica o pesquisador. Ostra é nome genérico, dado popularmente, para os moluscos que produzem pérolas. São várias as espécies, sendo que umas geram pérolas de formato parecido com o de grão de arroz, algumas produzem pérolas mais ovaladas e outras geram pérolas de formato arredondado.

Nos moluscos cultivados para esse fim, injeta-se um germe retirado do seu próprio tecido, para gerar uma espécie de "tumor", como se fosse um câncer. O animal não reconhece o material injetado e passa, como defesa, a produzir carbonato de cálcio em excesso. Assim, artificialmente, a ostra é induzida a produzir conchiolina, o principal componente da pérola que dá o aspecto perolizado, e também a aragonita. Para manter uma fazenda de ostras perlíferas, é preciso um manejo adequado, para que a "doença" provocada não prejudique o animal e para que o plantel esteja livre de predadores. Além disso, as ostras não suportam uma variação brusca na temperatura da água. O local tem que ser devidamente estudado do ponto de vista das marés que o influenciam. (Lana Cristina)

Software otimiza escoamento de óleo em bacias petrolíferas

Sistema computacional baseado em raciocínio inteligente e cooperativo aprimora o desenvolvimento de projetos

Brasília, 23 (Agência Brasil – ABr) – A professora de Ciência da Computação Ana Cristina Bicharra Garcia, da Universidade Federal Fluminense (UFF) desenvolveu um sistema computacional que possibilita ao usuário interagir com o computador para auxiliar nas tarefas de tomada de decisão. Uma das aplicações para o Active Design Documents (ADD) será na elaboração de plantas de escoamento de óleo.

Criado em parceria com a Petrobrás, a versão Sub do ADD permitirá a engenheiros traçar a rota ideal de escoamento de óleo retirado de plataformas offshore (marítimas). Como explica Ana Cristina, a vantagem do sistema em relação aos modelos em que o computador executa todo o processo é que o engenheiro pode avaliar as diversas variáveis que atuam sobre o sistema e escolher a que combina as melhores opções. "O problema é muito complexo, o mar apresenta diversos obstáculos – recifes, bancos de areia, navios afundados – e a participação de um engenheiro no processo propicia soluções criativas para vários desses problemas", diz ela.

Os cálculos, considerados a parte mais trabalhosa nos projetos, são realizados pelo ADD, baseados em informações previamente instaladas no computador. "Comparado a um modelo tradicional de desenvolvimento de projetos, o ADD é o engenheiro júnior, aquele que faz a parte braçal do sistema", analisa Ana Cristina. Isso, acrescenta a pesquisadora, permite ao engenheiro ficar livre para atividades mais criativas e para a tomada de decisão em situações mais complexas.

Outra vantagem do ADD destacada pela professora, são as várias possibilidades de solução para um mesmo problema, geradas pelo software. "O homem não tem paciência para testar vários arranjos, desenvolve no máximo três ou quatro e define entre esses o melhor. No computador as possibilidades de arranjos são multiplicas", comenta a professora

O ADD é resultado da tese de doutorado de Ana Cristina na Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, em 1992. A partir de então, ela desenvolve versões com aplicações específicas, como essa encomendada pela Petrobrás, mas estruturadas em modelos de raciocínio inteligente e cooperativo para auxiliar tarefas de tomadas de decisão. Na UFF, a equipe da pesquisadora desenvolve modelos do ADD voltados para a medicina e para o direito. Ana Cristina já recebeu quatro prêmios do Plano Nacional de Ciência e Tecnologia de Petróleo e Gás Natural (CTPetro) por suas pesquisas na área. (Hebert França)

Expansão desordenado da algaroba compromete meio ambiente nordestino

O avanço da árvore no Brasil ocorreu de forma descontrolada, sobre áreas recomendadas à produção agrícola.

Brasília, 23 (Agência Brasil – ABr) - A arborização com algaroba (Prosopis juliflora (SW) DC) é uma ótima opção para o semi-árido nordestino. Além de uma área de sombra, a árvore é muito valorizada na região pelos seus múltiplos usos em propriedades rurais e por ser extremamente resistente à seca. Da família das leguminosas, sua altura varia de 8 a 10 metros, embora em condições ideais possa chegar a 18 metros. Inicia a frutificação aos 2 anos, dependendo da região onde estiver plantada, e multiplica-se facilmente por sementes.

Originária do deserto do Piura, no Peru, onde o clima é mais hostil que no sertão nordestino, a algaroba foi introduzida no Brasil na década de 40 adaptando-se facilmente à caatinga. No início, foram cultivadas apenas quatro exemplares; hoje, são milhares de árvores espalhadas por todas as zonas agroecológicas da região. Essa expansão se deu de forma desordenada, sobre extensas áreas com maior umidade do solo, recomendadas para produção agrícola. Para o pesquisador Paulo César Fernandes Lima, da Embrapa Semi-Árido, a algaroba merece uma abordagem ampla da sua presença no ambiente da caatinga. "Se mal manejada, a espécie é capaz de causar grandes malefícios, principalmente os de ordem ambiental", observa ele.

O pesquisador explica que o grau de interferência do homem na caatinga provocando a degradação dos solos é um dos fatores que contribuem para o estabelecimento e invasão das algarobeiras na região. Com grande capacidade de regeneração e dispersão, a planta se estabelece com mais rapidez e de forma desordenada na área degradada e inibe a expansão natural das espécies nativas d bioma. Segundo dados da Embrapa, perto de 70% dessas áreas já sofrem pressão da ação do homem.

Por outro lado, a árvore é utilizada para os mais diversos fins. É boa produtora de madeira para lenha, carvão, cercas, construções rurais, imóveis, estacas e queima em fornos industriais. Ainda é fonte de alimentos para bovinos, caprinos, ovinos e eqüinos. As folhas e as vagens são servidas às criações inteiras ou trituradas, cujo teor protéico é razoável, porém não contêm alguns aminoácidos importantes em boa quantidade. É, na verdade, alimento energético. A partir dela ainda é possível a produção de álcool etílico, pois a grande concentração de açúcares confere um sabor adocicado às vagens.

Outra vantagem da algaroba no sertão nordestino apontada pelos técnicos é que ela fornece forragens, na época em que a maioria das outras plantas está desfolhada. Também apresenta uma estrutura biológica que ajuda na fixação de nitrogênio no solo e na recuperação de áreas degradadas; vegetando desde o nível do mar até 1.500 metros de altitude, em locais com precipitações entre 150 e 750 milímetros de chuvas por ano.

Segundo o biotecnologista do Departamento de Tecnologia Química e de Alimentos da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Manoel Ferreira Alves, há muito tempo a imagem da algaroba está deturpada pela falta de conhecimento sobre suas potencialidades. "Existe uma empresa instalada no Distrito Industrial do Recife que produz um tipo de cola a partir da resina extraída da árvore. Isso só comprova o potencial da planta", defende ele. (Cecília Resende)

Manejo impedirá que algaroba invada outras regiões do Nordeste

Plano de controle vai durar dois anos e abrangerá dez áreas em quatro estados

Brasília, 23 (Agência Brasil - ABr) - Preocupada com a expansão desordenada da algarobeira na região do semi-árido nordestino, a Embrapa Semi-Árido inicia um projeto, que visa, entre outras coisas, favorecer a exploração produtiva da espécie sem causar maiores danos à natureza. Os trabalhos serão realizados durante dois anos em dez áreas de invasão da árvore, localizadas nos estados do Piauí, Paraíba, Bahia e Pernambuco.

O projeto, "Manejo de Áreas Invadidas por Algarobeira", receberá recurso de R$ 210.293,00 do Programa Nacional de Diversidades Biológicas (Pronabio) do Ministério do Meio Ambiente (MMA). O trabalho será executado em conjunto com a UFPB e a Diretoria de Desenvolvimento Florestal (DDF) da Secretaria de Agricultura da Bahia. Além da análise da situação existente nestas regiões, o projeto visa ainda estudar os segmentos da cadeia produtiva do vegetal.

"Queremos auxiliar o produtor no manejo da planta, que tem grande potencial", conta Paulo César Fernandes Lima, da Embrapa. Em áreas invadidas pela árvore, onde a sua velocidade de expansão é bem maior que as nativas, a Embrapa propõe o corte para emprego como estaca, carvão e combustivel em fornos industriais. Lima ressalta que isso deve ser feito nas áreas que têm, em média, mais de 100 árvores por hectares. Segundo ele, uma árvore com 15 anos produz 78 kilos de vagem por ano.

Outra preocupação da Embrapa é controlar a invasão da espécie, que inibe a implantação natural das nativas. Para isso foram feitos estudos na Bahia, onde Lima comparou a diversidade de espécies vegetais regeneradas em uma área de caatinga natural e em outra sob pressão antrópica (atividades humanas). Na área preservada foram encontradas cerca de 60 espécies arbóreas/arbustivas diferentes, estimadas em 902 plantas adultas/hectare. Na totalmente degradada, encontrou-se apenas duas espécies, correspondendo a 18 plantas adultas/ha, sendo a algarobeira a espécie dominante.

Como resultado dos estudos já iniciados, o plano de manejo a ser definido pelo projeto pretende reduzir em até 60% o avanço espontâneo da algarobeira sobre áreas de caatinga. Uma das medidas em avaliação é o manejo de animais nessas áreas; isso porque a ingestão das vagens "in natura" não eliminam totalmente as sementes que são disseminadas pelas fezes. Em contato com o solo e encontrando boas condições de umidade, germinam e crescem, infestando a região. Assim, os animais são os agentes "dispersores" e a água os "facilitadores".

Alimentação

Em meados da década de 90, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) concluiu uma pesquisa com a algaroba, que visava enriquecer a qualidade da alimentação das populações de baixa renda que habitam o nordeste. "A espécie foi escolhida como suprimento alimentar porque é a única árvore que sobrevive no período da seca", informa a professora do Departamento de Bioquímica da universidade, Dilma Ferreira Lima. Ela ressalta que nessa época as pessoas comem apenas bolacha, feijão e milho, ficando, muitas vezes, desnutridas.

Segundo a professora, os técnicos desnutriram um rato com dietas de baixo percentual de proteína para determinar o ponto ótimo de complementação, cuja qualidade protéica ideal foi definida com torno de 80% de feijão e 20% de algaroba. "A ração dada a esses ratos passa por um processo para retirada do açúcar, e um acréscimo de lipídios, vitaminas, sais minerais e fibras", explica ela.

"O objetivo do trabalho foi mostrar que apesar da algaroba ser protéina vegetal de qualidade inferior às de proteína animal, como por exemplo a caseína retirada do leite, ela é capaz de nutrir o animal em 60% de sua capacidade", observa Dilma. Ela ainda completa que mesmo a farinha da algaroba "in natura" contendo 21% de proteína, ou seja, insuficiente e de baixa qualidade, é capaz de ajudar a combater a desnutrição da população mais carente. (Cecília Resende)

"Coquetel" de fungos combate verme em flores e hortifrutigranjeiros

O produto é obtido com a reunião de fungos encontrados normalmente no solo em um preparado de arroz

Brasília, 23 (Agência Brasil - ABr) - Um "coquetel" de cinco fungos pode se tornar em breve um importante aliado no combate aos nematóides de galha (Meloidogyne spp), a uma das pragas mais danosas ao cultivo de flores e hortifrutigranjeiros. Vermes parecidos com minhocas, mas muito menores, que medem entre 0,5 milímetro na fase juvenil e 1 milímetro na fase adulta, eles se instalam nas raízes das plantas e causam alterações visíveis na forma de caroços chamados de galhas, que reduzem a absorção e o transporte de água e de nutrientes para a planta, comprometendo ou, em casos extremos, até mesmo inviabilizando a cultura.

O agrônomo Jaime Maia dos Santos, da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp), de Jaboticabal, comprovou que alguns fungos, encontrados normalmente no solo e inofensivos às culturas, se crescidos num preparado especial de arroz, transformam-se num poderoso predador natural desse tipo de nematóide. "Com o coquetel, podemos pensar em fazer o controle biológico dessas pragas, sem recorrer a produtos químicos para matar os nematóides", comenta Santos, que, se arrumar um parceiro comercial, deve passar a produzir em escala o seu preparado de fungos nematófagos, de olho no crescente mercado da agricultura orgânica.

Ele acredita que exista demanda por um produto barato e ecológico como a sua mistura de fungos. "Não sei exatamente quanto custaria o tratamento com o coquetel, mas posso garantir que é algo bem em conta", afirma o agrônomo. Além de caros, os nematicidas químicos podem ser danosos ao ambiente. Para complicar ainda mais a vida do agricultor, as outras alternativas empregadas no combate a esses vermes - como a rotação de culturas (para reduzir a quantidade de nematóides no solo) ou o emprego de variedades de plantas mais resistentes a essa praga agrícola - estão pouco disseminadas ou não estão à mão do homem do campo.

É verdade que ainda não se pode dizer que o coquetel é a salvação da lavoura em termos de combate aos nematóides de galha. Eles atacam desde plantas como feijoeiro até árvores como a seringueira. Os maiores prejuízos são causados nas espécies vegetais que demoram cerca de 90 a 100 dias para crescer e produzir, as chamadas culturas de ciclo curto, como tomate, alface, pepino, melão e flores em geral. Isso porque, por enquanto, o produto mostrou-se eficaz apenas quando aplicado em locais onde o cultivo ocorre em estufas. "Em plantações a céu aberto, em que a temperatura e umidade variam muito, o coquetel não se deu bem", explica Santos, cujas pesquisas são financiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp) em dois projetos.

Outra restrição, temporária na visão dos cientistas é que até agora, o preparado contra os nematóides só obteve pleno sucesso no cultivo do crisântemo (Dendranthema grandiflora). Experimentos feitos em culturas de algodão e laranja, que são costumeiramente atacadas por espécies de vermes semelhantes aos nematóides de galha, indicam que o coquetel ainda não alcançou o efeito esperado. "Mas acreditamos que o controle biológico funcionará em plantas ornamentais e hortaliças em geral", diz Santos. "Tanto que iniciamos testes em estufas e a céu aberto com outras espécies de flores e tomates".

O entusiasmo de Santos com o coquetel vem dos excelentes resultados obtidos recentemente em estudos conduzidos num dos grandes pólos da floricultura nacional, o município paulista de Holambra. Testes feitos durante o verão em estufas de uma propriedade da região, mostraram que uma variedade de crisântemos de coloração branca chamada de Calábria respondeu positivamente ao controle biológico de nematóides. A produtividade dos canteiros altamente contaminados por nematóides cujo solo, antes do plantio da muda, recebeu a mistura de fungos foi no mínimo 30% superior ao rendimento dos canteiros igualmente infestados mas que não passaram pelo controle biológico.

Outro benefício do coquetel observado é que a área tratada com os fungos rendeu flores com hastes de melhor qualidade e maior tamanho e diâmetro. "Esse tratamento é uma das principais inovações dos últimos anos, tanto no aspecto tecnológico como ambiental", avalia o agrônomo Jaime Motos, da Flortec, uma empresa de Holambra que presta consultoria técnica aos produtores da região e participou dos experimentos.

Nas pesquisas de campo, os agrônomos constataram que o nematicida ecológico pode ser aplicado no solo da estufa antes do plantio das flores ou no próprio substrato que receberá a muda. Os estudos também comprovaram que o emprego do coquetel de cinco fungos - Paecilomyces lilacinus, Arthrobotrys musiformis, Arthrobotrys oligospora, Dactylella leptospora e Monacrosporium robustum, este último uma espécie registrada pela primeira vez no Brasil pela professora Arlete Silveira, ex-membro da equipe de Santos - é mais eficiente no combate aos nematóides de galha do que o uso isolado de apenas uma ou duas espécies desses microrganismos.

Esses fungos têm velocidade de crescimento e capacidade competitiva com outros microrganismos do solo. Além disso, o fato de cada fungo atacar os nematóides de uma forma diferente e, às vezes, em estágios distintos da vida do parasito, talvez contribua para o sucesso do preparado biológico. O M. robustum, por exemplo, perfura os ovos dos nematóides, destruindo-os, golpe que ajuda a quebrar o ciclo reprodutivo do verme. Algumas espécies de Arthrobotrys formam anéis nos poros do solo por onde os nematóides migram. Ao penetrarem nesses anéis, esses se contraem estrangulando os nematóides. O A. oligospora produz redes adesivas para capturar os nematóides, romper a parede do corpo e consumir o seu conteúdo.

O palco dessa luta é o solo próximo às raízes da planta infestada - e não o interior do vegetal. Após a eclosão dos ovos, os vermes deixam o solo, penetram nas raízes das plantas hospedeiras, onde permanecem até a fase adulta. Lá, eles geram as galhas que levam ao apodrecimento das raízes, comprometem o crescimento e a produção da planta. Estima-se que a produção agrícola tenha uma perda de rendimento de mais de 10% em razão da ação dos nematóides.

Embora os resultados promissores do coquetel de fungos ainda se restrinjam a uma espécie de flor e a locais de cultivo controlado (estufas), o pesquisador da Unesp está satisfeito em saber que seu produto será uma alternativa viável, pelo menos, para os cultivos protegidos. "Às vezes, o fungo é uma fera nos testes de laboratório, mas decepciona quando o levamos a campo", pondera Santos, que se deu conta da eficácia desses microrganismos na luta contra os nematóides há cerca de cinco anos, quando tentava controlar infestações desses vermes em seringais em Mato Grosso.

Com um pouco de sorte e muita observação, o agrônomo chegou aos fungos nematófagos. O pesquisador não estava obtendo muito sucesso no controle da praga, quando percebeu que, de forma aparentemente espontânea, sem a ajuda de nenhum produto químico, algumas seringueiras se livraram dos nematóides enquanto outras nunca logravam tal feito. O dado o intrigou e, depois de uma série de análises, Santos identificou uma grande população de fungos na terra junto às raízes das árvores que haviam se livrado da praga. Surgia assim a idéia de usar os fungos encontrados nos seringais de Mato Grosso (presentes também em outras partes do país) como controle biológico em outras plantas.

Num outro trabalho executado por um membro da equipe de Santos na Unesp de Jaboticabal, o biólogo Anderson Soares de Campos fez um levantamento nas principais zonas de laranjais do estado sobre a incidência do chamado nematóide dos citros (Tylenchulus semipenetrans e Pratylenchus spp) em viveiros fechados, a céu aberto e em pomares comerciais. Os resultados foram preocupantes.

Pouco mais de 1/3 dos viveiros a céu aberto, além de três protegidos e quase 3/4 dos pomares comerciais estavam infestados pelo nematóide dos citros, que parasitam as raízes das laranjeiras e dos limoeiros e lhes rouba água e nutrientes, reduzindo, em média, a produtividade do cultivo em 14%. No mesmo trabalho, também foi constatado que pouco menos de 20 pomares e, pelo menos, sete viveiros abertos estavam infestados por Pratylenchus jaehni, uma espécie nova, descrita na literatura científica apenas no ano passado por pesquisadores do exterior, com a participação de Santos.

Para verificar a incidência de nematóides em viveiros, Campos recolheu 2.518 amostras de 595 viveiros localizados em 99 municípios paulistas. No caso de pomares comerciais, o biólogo analisou 1.078 amostras coletadas em pomares de 86 municípios. "A principal forma de infestação dos laranjais por nematóides é por meio do uso de mudas já infestadas com o verme", diz Santos. A partir de 2003, serão proibidos a produção, comercialização e o transporte de mudas de citros produzidas a céu aberto no estado de São Paulo.

"Essa medida, aliada ao combate da praga nos laranjais, deve ajudar a reduzir os danos causados pelos nematóides", avalia Santos. O apoio à implementação dessa iniciativa é mais uma luta abraçada pelo grupo de Jaboticabal, que espera disponibilizar, em breve, para os agricultores, os fungos predadores de vermes. (Pesquisa Fapesp)