Portugal envelhece e idosos sem substitutos permanecem trabalhando para ter renda

23/06/2013 - 17h18

Gilberto Costa
Correspondente da Agência Brasil/EBC

Lisboa - É cena comum no comércio de Lisboa ver idosos trabalhando. Não há estatística oficial sobre o fenômeno, porque muitos se ocupam informalmente e por conta própria. Especialistas consideram que há mais de uma razão para as pessoas acima dos 65 anos continuarem trabalhando. Os motivos vão desde o prazer do ofício até a necessidade econômica, agravada com a crise e o desemprego que afeta filhos e netos em idade ativa.

Há também quem ainda trabalhe para manter-se em atividade e, assim, cuidar da saúde. É o que explica Júlia Rodrigues Azevedo Nunes, de 77 anos, dona há mais de 40 anos de uma pequena mercearia. “A médica não quer que eu largue isto. Enquanto estou aqui, estou entretida. Vem uma pessoa e conversa. Aqui é meu passatempo”, disse dona Júlia à Agência Brasil antes de aconselhar que “ir para casa é morrer mais depressa”.

Além da saúde, há quem trabalhe porque não tem descendente que o substitua. No caso de dona Júlia, a única filha é dona de uma butique e os dois netos ainda estão estudando, e mais ninguém na família se interessa por trabalhar na mercearia, revela. A falta de pessoas que substituam os mais velhos nas atividades laborais é um fenômeno no país, que tem cada vez menos crianças, adolescentes e adultos na chamada idade ativa, até 65 anos.

“Desde 2010 que o número de pessoas potencialmente a sair do mercado de trabalho (pessoas de 55 a 64 anos de idade) não é compensado pelo número de pessoas potencialmente a entrar no mercado de trabalho (pessoas com 20 a 29 anos de idade); em 2012, por cada 100 pessoas potencialmente a sair do mercado de trabalho apenas 89 estariam potencialmente a entrar no mercado de trabalho”, descreve boletim publicado na semana passada pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE) de Portugal.

Conforme o INE, o número de idosos para cada 100 pessoas em idade ativa cresce desde 1991. No ano passado, para cada 100 pessoas em idade ativa residiam em Portugal 29 idosos. A tendência é mais envelhecimento no futuro próximo. Desde a virada do século, o número de pessoas com mais de 65 anos é maior do que de crianças e adolescentes em Portugal.

De acordo com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, que na semana que passou promoveu o seminário O País Pode Morrer de Velho?, “o número de pessoas com 65 e mais anos nunca foi tão alto, em Portugal, como atualmente”, e muitos vivem sós. A maioria (52%) das “famílias unipessoais” tem 65 ou mais anos. Duas razões demográficas explicam o envelhecimento: a elevada expectativa de vida (hoje em quase 80 anos) e diminuição da fecundidade. A taxa de fecundidade da portuguesa é 1,28 filho, abaixo do índice no Brasil (1,9 filho) e da taxa mínima para que haja crescimento populacional (2,1 filhos).

A situação demográfica está fazendo com que brasileiros estudem o envelhecimento em Portugal. Esee é o caso de Wilson José Alves Pedro, professor de gerontologia da Universidade Federal de São Carlos – SP, e de Janaína Alvarenga Aragão, professora de enfermagem da Universidade Estadual do Piauí, que fazem pesquisa no Instituto do Envelhecimento da Universidade de Lisboa

Segundo a professora, o Brasil, que sempre foi jovem, se depara com realidade nova e o Estado e a sociedade devem “garantir que apesar da necessidade de cuidados, as pessoas [idosas] possam definir o que querem”. O protagonismo da população também é defendido por Wilson Pedro, que sugere a “escuta permanente” da população entre profissionais e organizações que atendam ao público. Chama a atenção dele a independência e a circulação de idosos em Lisboa, o que em parte se deve às políticas públicas. “Aonde a gente vai, observamos as pessoas com suas garantias de mobilidade”.

Edição: Fernando Fraga

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