Maioria das famílias ainda espera 24 horas para registrar desaparecimento de crianças e adolescentes

22/06/2012 - 19h03

Camila Maciel
Repórter da Agência Brasil

São Paulo – Apenas 15% dos casos de crianças e adolescentes desaparecidos na cidade de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, são registrados de imediato, aponta levantamento da Fundação Criança, órgão da prefeitura municipal. O estudo, divulgado hoje (22), mostra que 42% das famílias ainda aguardam 24 horas para registrar a ocorrência, mesmo depois da Lei 11.259/2005, que prevê o início imediato das investigações.

O estudo analisou 1.086 boletins de ocorrência  registrados no período de 2006 a 2012, com objetivo de identificar o perfil dos desaparecidos no município. O documento foi apresentado hoje, no 2º Seminário de Enfrentamento à Situação de Desaparecimento de Crianças e Adolescentes de São Bernardo.

“A gente não consegue medir se as pessoas esperaram porque a polícia indicou ou se eles propriamente, por uma questão até cultural, achavam que deviam atuar dessa forma”, disse o presidente da Fundação Criança, Ariel de Castro Alves, que é também vice-presidente da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Segundo o levantamento, 60% dos desaparecidos são meninas e 40%, meninos e a maioria dos casos envolve adolescentes com idade entre 11 e 17 anos. As causas mais comuns do desaparecimento são fuga do lugar (51%), envolvimento com a criminalidade (14%) e fuga de instituições (12%). “Mais da metade dos desaparecimentos é em decorrência de conflitos do lar, muitas vezes em razão de violência doméstica", destacou Ariel. Para ele, o estudo ajudará a desenvolver uma política pública de prevenção.

O levantamento revelou ainda que, em São Bernardo do Campo, 95% dos casos foram solucionados. “Temos apenas nove casos de desaparecimento sem solução, que representam 1% do total. É um percentual bem abaixo da média nacional, de 20%”, disse Alves.

De acordo com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Crianças e Adolescentes Desaparecidos, da Câmara dos Deputados, criada em 2007, ocorrem, em média, 40 mil casos de desaparecimento por ano no país, 9 mil só em São Paulo.

Para Alves, a grande diferença entre o percentual de casos solucionados no município e a média nacional deve-se ao trabalho integrado dos órgãos competentes na busca aos desaparecidos. “Todo registro de desaparecimento na Polícia Civil é encaminhado para a Fundação Criança. De imediato, nós atendemos as famílias, distribuímos cartazes e divulgamos nos meios de comunicação”, explicou.

De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, apenas as cidades de São Bernardo e Curitiba têm programas específicos para casos de desaparecimento em âmbito local. Para a coordenadora substituta do Programa de Convivência Familiar e Comunitária da Secretaria de Direitos Humanos, Denille Melo, o envolvimento dos municípios é fundamental para solucionar os casos.

“Sem uma rede integrada, não é possível ter uma política pública de direitos humanos desenvolvida. O ideal é que os municípios assumam, com o apoio da sociedade civil, e que os órgãos competentes de segurança pública em cada estado acompanhem esse trabalho”, explicou.

A presidenta da Associação Mães em Luta, Vera Lúcia Ranu, disse que a falta de integração dos órgãos governamentais é um dos principais problemas para uma efetiva política pública de busca aos desaparecidos. “A criança desaparece em um estado, mas se desloca para outro local. Até agora, o cadastro nacional não deu conta de unificar as informações de desaparecidos no país.”

Vera Lúcia acredita que isso pode melhorar com o portal do Cadastro Nacional de Busca a Crianças e Adolescentes Desaparecidos, lançado em março deste ano, sob responsabilidade da Secretaria de Direitos Humanos e do Ministério da Justiça. “Nossa esperança é que os órgãos competentes alimentem o cadastro. As entidades também estarão empenhadas em incluir os novos casos”, disse ela.

Na opinião de Denille Melo, dentro de um ano poderá ser feito um diagnóstico dos casos de crianças e adolescentes desaparecidos no país. Segundo Denille, outro portal mantido pelo Ministério da Justiça reúne casos de desaparecidos em geral, mas há defasagem na atualização dos dados. Para ela, é preciso haver mais envolvimento das entidades na atualização do cadastro.

"O sistema receberá os dados, e a secretaria irá checar a fidelidade das informações prestadas, em seguida, o caso é tornado público. Também estamos trabalhando com os órgãos de segurança pública para permitir a atualização efetiva das informações”, informou Denille. O novo portal tem atualmente 125 cadastros.

Edição: Nádia Franco