Otimismo com a nova classe média pode ser “contraproducente”, alerta especialista português

31/01/2012 - 13h20

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil


Brasília – “O discurso eufórico quanto ao crescimento ininterrupto da nova classe média pode ser contraproducente”, aconselha o sociólogo Elísio Estanque, professor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra e pesquisador do Centro de Estudos Sociais em Portugal.

“Não estando a economia de fato suficientemente desenvolvida e não havendo uma capacidade competitiva que garanta uma sustentabilidade para as próximas décadas, esse desafogo pode não passar de uma situação esporádica e momentânea”, pondera o especialista que lançou, na semana passada, em seu país, o livro Classe Média: Ascensão e Declínio, a respeito da atual decadência econômica que vive o estrato social em Portugal.

Segundo o sociólogo, uma parte da classe média assalariada portuguesa, que no total equivale a um terço da população (cerca de dois milhões de famílias com renda em torno de  1,5 mil euros), “sempre dependeu muito das políticas sociais e, portanto, da saúde financeira do Estado”. De acordo com ele, havia uma concepção em Portugal de que o Estado deveria “sustentar a coesão da sociedade e redistribuir a riqueza de forma a impedir que as desigualdades caminhem até o ponto da ruptura”.

A classe média portuguesa, “que sempre dependeu muito do Estado de bem estar social”, nunca experimentou, no entanto, “uma sustentabilidade muito forte que a fixasse realmente na estrutura intermédia da sociedade de forma a responder todas as expectativas de padrões de vida e de padrões de consumo”.

Além das políticas públicas, o estrato tornou-se dependente do crédito e se endividou pesadamente. A crença de que o progresso social não pararia “facilitou a propensão da classe média ao consumo que, a partir de uma determinada altura, só foi possível alimentar com base no endividamento”, descreve ao dizer que hoje há inúmeras famílias tomando novos empréstimos para pagar antigas dívidas e, assim, tentar manter o padrão de classe média (como ter filhos em colégio particular e pagar a casa própria).

Em seu livro, Eliso Estaque avalia que após o período de crescimento (antes da crise econômica mundial), a classe média em Portugal vivia a condição de “pobreza envergonhada”. Para o especialista, atualmente, essa classe “sofre com uma dupla violência: de um lado tem as dificuldades e as carências econômicas e, por outro, tem o estigma de já ter ocupado um status social de reconhecimento simbólico e agora tem de assumir o seu empobrecimento”.

O sociólogo, que já morou no Brasil e conhece os estudos da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sobre os 30 milhões de brasileiros que ascenderam economicamente na última década, tem como projeto voltar ao país no próximo ano para fazer um estudo qualitativo sobre a classe média paulista.

 

 

Edição: Lílian Beraldo