Paraná usa tecnologia de envelhecimento digital para achar crianças desaparecidas

13/03/2011 - 17h41

Elaine Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil

São Paulo - Há sete anos, Viviane de Araújo Alves saiu de casa para ir à padaria, em São Bernardo de Campo (SP), e nunca mais voltou. Ela tinha 11 anos de idade e reclamava que a mãe, Telma de Araújo Alves, a prendia muito e que não a deixava dormir na casa das amigas. Na mesma semana do desaparecimento, a filha tinha contado para a mãe que uma vizinha tinha fugido de casa. Quando percebeu que a filha não voltava para casa, Telma saiu em busca de Viviane. Foi até a padaria, passou por algumas praças e não a encontrou. No dia seguinte, procurou uma delegacia de polícia para fazer o registro do desaparecimento.

“Na época, não se fazia B.O. [boletim de ocorrência] no mesmo dia [do desaparecimento]. No outro dia, fiz o B.O., procurei a Mães da Sé [organização não governamental Associação Brasileira de Busca e Defesa a Crianças Desaparecidas, criada em 1996 por iniciativa de mães de crianças desaparecidas] e continuei a busca em praças do centro de São Paulo e em todos os lugares onde me diziam que tinham crianças de rua”, afirmou. A busca também foi feita em hospitais e no Instituto Médico Legal (IML), também sem sucesso.

Procurando por pistas, Telma ouviu o relato de um motorista de ônibus que disse ter transportado a filha dela até o centro de São Paulo. “Ele falou que ela entrou no ônibus e foi até o Parque D. Pedro. Ela estava com uma menina morena”, disse a mãe. Até hoje, Telma continua sem receber notícias da filha. “É como se tivesse acontecido agora. É uma falta. Não se sabe se ela está viva ou morta, se está comendo, se está na rua, se tem uma família. Só que, hoje, acho que Deus confortou mais meu coração e me deu sabedoria para lidar com essa situação. Foi um desespero grande logo no começo”, disse ela, que tem mais dois filhos.

Enquanto alimenta a esperança de abraçar a filha novamente, Telma recorreu à tecnologia e envelhecimento digital. Por meio de uma parceria entre a Fundação Criança, de São Bernardo do Campo, e o Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas (Sicride) da Polícia Civil do Paraná, várias fotos de Viviane, dos pais e dos irmãos dela resultaram em uma imagem de como seria a fisionomia da menina nos dias de hoje. A técnica de envelhecimento digital é feita pelo Sicride de Curitiba (PR) desde 1996.

“São necessárias fotografias da criança, principalmente as que são focadas no rosto, fotos dos pais e dos irmãos em várias fases da vida. É feita toda uma medição, um estudo da fisionomia da criança. São medidas as distâncias entre os olhos, entre as orelhas e o queixo, entre a boca e os olhos. Com o estudo da progressão da idade, se consegue fazer um desenho-imagem bem aproximado de como estaria a criança nos dias de hoje”, explicou Ana Claudia Machado, delegada chefe do Sicride.

Segundo a delegada, o trabalho minucioso é desenvolvido por um artista forense e leva, no mínimo, 30 dias para ser concluído. Para esse tipo de trabalho, o artista também conta com um banco de dados de imagens, com fotos de pessoas que foram à delegacia fazer documentos de identidade. “Ele [o artista forense] tem olhos, narizes e bocas em número bem grande para poder ajudá-lo a fazer esse estudo da progressão da idade”.

De acordo com a delegada, uma das importâncias dessa técnica do envelhecimento digital de crianças e adolescentes desaparecidos é seu caráter preventivo. “Quando as pessoas veem divulgado esse trabalho, passam a ver que os desaparecimentos de fato acontecem e começam a orientar melhor seus filhos”. Além disso, ela destaca que a técnica ajuda a formar uma imagem mais atual do desaparecido. “A gente sabe que as transformações são muito grandes com o passar dos anos”. Segundo ela, a orientação é para que essas imagens sejam refeitas a cada oito anos, período de tempo onde acontecem as transformações mais significativas na fisionomia das pessoas.

Mas nem sempre a técnica pode ser utilizada. Segundo a delegada, há muitos casos em que os pais ou familiares tem poucas fotos (ou nenhuma) da criança desaparecida, ou as fotos têm pouca qualidade. Ocorrem ainda casos que os irmãos não são filhos do mesmo pai ou da mesma mãe, fatores que dificultam o trabalho.

Com o envelhecimento digital, Telma agora tem uma foto de Viviane envelhecida em mãos e várias dessas imagens estão sendo divulgadas por ONGs e na internet. “Ela era tão menininha e agora já é uma mulher”, disse a mãe, sobre a imagem envelhecida da filha.

Além da foto de Viviane, a Fundação Criança encaminhou a foto de outra criança à polícia do Paraná para que também seja feito o procedimento de envelhecimento digital. Segundo o presidente da entidade, Ariel de Castro Alves, o objetivo é adotar a mesma técnica para tentar solucionar cinco casos de crianças desaparecidas que estão sendo investigados pela fundação.

No Paraná, há um projeto de lei que propõe que os órgãos públicos sejam obrigados a acessar a página do Sicride na internet e imprimir o cartaz com as fotos das crianças desaparecidas, para que possa ser fixado em local visível. Parcerias com a iniciativa privada para expor as fotos das crianças desaparecidas em elevadores, praças de pedágio e até em mensagens de telefones celulares também estão em estudo. O Sicride mantém, em seu endereço na internet, um banco de imagens com fotos envelhecidas de crianças e adolescentes que desapareceram no Paraná há muito tempo.

Edição: Vinicius Doria