Flip vive noite de Chico Buarque e Milton Hatoum

03/07/2009 - 23h15

Lísia Gusmão
Enviada especial da EBC
Paraty (RJ) - Na mesa mais concorridada 7ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip),dois escritores contemporâneos esmiuçaram as suas obrasque têm em comum o resgate da história do Brasil apartir de memórias familiares. Chico Buarque e Milton Hatoumforam protagonistas de um encontro entre os que traduzem o Brasil pormeio da literatura.Em Leite Derramado,Chico Buarque usa a falha memória do narrador, um homemcentenário, para voltar ao Brasil Colônia e caminhar,por meio das gerações, até o presente. “Ofiltro é a memória do velho. E é escrito deforma desordenada, porque a memória dele édesordenada”, disse. Chico Buarque admitiuque a sua escrita depende da música. No caso de LeiteDerramado, há uma forte influência de VelhoFrancisco, canção de sua autoria. “Se uma fraseou um parágrafo não estiver ‘cantável’ emalgum lugar da minha cabeça, eu recuso. A literatura nãoprecisa se alimentar só de literatura”, afirmou.A memóriafamiliar também é recorrente nas obras de MiltonHatoum. O amazonense voltou mais uma vez à terra natal paraambientar Órfãos do Eldorado. Hatoum, aliás,não rejeitou o rótulo de escritor regionalista. “Souo mais regionalista dos escritores. E quanto mais regionalista, maiora divulgação”, brincou.Em perfeita sintonia,os dois autores trocaram impressões bem humoradas sobre osfantasmas que acompanham a escrita, saciaram as curiosidades sobre aobra do outro e arrancaram risos da plateia ao revelar detalhes doprocesso criativo. Chico descreveu, porexemplo, como chegou ao caso do parlamentar que conseguiu a concessãodo Porto de Manaus por ser amigo do então presidente CamposSalles. Ao interlocutor que lhe relatava o fato, o escritor indagou:“Isso é mamata, não é?”. E arrematou:“Acontece até hoje”.Hatoum, por sua vez,contou que, atendendo a um pedido seu, uma sobrinha foi aos arquivospúblicos pesquisar duas ou três eventuais “falcatruas”que poderiam ilustrar a sua obra. “Ela encontrou 26”, disse, àsgargalhadas, Hatoum.Como não havialugar para todos os que queriam ver e ouvir Chico Buarque e MiltonHatoum, os leitores e fãs aglomeraram-se nas grades quecercavam a tenda do telão, instalada na Praça daMatriz, centro histórico de Paraty, para reproduzirsimultaneamente as mesas da tenda dos autores, palco principal daFlip. Ao final, uma vozinformou que Chico Buarque autografaria um número limitado delivros e não tiraria fotos. A última informação,o escritor prontamente tratou de corrigir. Seria impossívelimpedir que o público o fotografasse tão logocaminhasse pelas ruas de pedras de Paraty.