Sociedade de Genética revela que no Brasil nascem oito bebês sem cérebro por dia

28/08/2008 - 17h17

Paula Laboissière
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A cadatrês horas, nasce uma criança anencéfala noBrasil – no total de oito bebês por dia. Os dados foramdivulgados pela SociedadeBrasileira de Genética Clínica, hoje (28), na segunda audiência pública para discutir a interrupçãode gravidez em casos de fetos com má formação ou sem cérebro. O representante do órgão,Salmo Raskin, reforçou que o problema é mais freqüentedo que se imagina e que não pode ser totalmente prevenido com adição de ácido fólico nadieta da gestante.

“Aanencefalia ocorre por volta do 24º dia de gestação.A gestante ainda não sabe que está grávida.Quando ela descobre  - e não usou o ácido fólico -não adianta mais, porque o tubo neural do feto já estáfechado.”

Segundoele, a patologia é mais freqüente em fetos do sexofeminino, com possibilidade maior de acometer mulherescom histórico de anencefalia. O risco chega a ser 50 vezes maior para as mulheres que jágeraram fetos anencéfalos – ainda que tenha sido interrompida.

“Émuito comum a presença de outras má-formações– em 20% a 40% dos casos de anencefalia. Esse alto índicenão permite a doação de órgãos. Osbebês morrem muito rápido, não dá tempo.Não se pode fazer o transplante antes do sétimo dia de vida,e eles não sobrevivem.”

Para o assessor da da Organização das Nações Unidas para assuntos de Saúde da Mulherd, José Aristodemo Pinottii,  membro daAcademia Nacional de Medicina, a interrupção a gravidezem casos de anencefalia sequer cpode ser classificada como aborto, porque ofeto anencéfalo não tem “potencialidade de vida”.

O ginecologista e obstetra ThomasRafael Gollop,  membro da SociedadeBrasileira para o Progresso da Ciência, destacou que o feto com esse tipo de anomalia é “um morto cerebral que tem batimentoscardíacos e respiração”. Ele lembrou que aanencefalia é a segunda má-formaçãocongênita mais comum no mundo e que o Brasil está em quarto lugar no  ranking de casos dapatologia. “É um problema de saúde pública.”

Dados daSociedade Brasileira para o Progresso da Ciência indicam que ainterrupção da gravidez em casos de anencefalia jáé permitida em países da Europa, no Canadá, naChina e em Cuba, mas é proibida na Irlanda, em paísesislâmicos e na América do Sul – com exceçãodo Brasil e do Uruguai, que permitem a medida caso haja aval doJudiciário.

“Aproximadamente75% dos fetos anencéfalos morrem no útero. Todostêm sobrevida vegetativa que cessa, na maioria dos casos, em 24horas e nas primeiras semanas. Foram mais de 5 mil alvarásjudiciais concedidos para a interrupção de gravidez comanencefalia entre 1989 e 2008.”

Ao final da audiência pública, Débora Diniz,antropóloga e membro do Instituto de Bioética, DireitosHumanos e Gênero (Anis),  ressaltou que a principal conclusãoa que se chegou, até o momento, é que aanencefalia, “por absoluto consenso”, é uma doençaletal em 100% dos casos.

“Nãoimporta se foi uma gestação planejada, se já háexpectativa pela chegada do bebê. Em geral, o diagnósticoé feito durante a ecografia, um momento em que as mulheresbuscam conhecer o sexo da criança e começar o enxoval. Em muitos casos, o que ocorre é uma lenta edesesperada busca por tribunais para evitar que o feto alcance 500gramas ou 20 semanas de gestação e precise serenterrado. É uma experiência de tortura.”

A Anis éco-autora da Argüição de Descumprimento dePreceito Fundamental (ADPF) 54, que propõe a garantia dodireito à antecipação terapêutica do partoem casos de anencefalia no feto. A ação foi propostapela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde(CNTS) e tem o objetivo de garantir o direito de escolha das mulherese proteger os profissionais de saúde que quiserem realizar oprocedimento.