Programa de rádio abordava problemas do dia-a-dia de detentas

27/01/2008 - 16h48

Morillo Carvalho
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Comvinheta tendo ao fundo a música Admirável Gado Novo, docantor Zé Ramalho, toda semana, os moradores do municípiopaulista de Votorantim, sabiam que começava um programade rádio feito de dentro do presídio feminino da cidade.Aforma de ultrapassar os muros que cercam o PresídioFeminino do município possibilitounovas perspectivas de vida para as detentas. O programa Povo Marcadofuncionava assim: uma equipe, formada pelos coordenadores, cuidava daprodução fora do presídio.Aoutra era composta pelas próprias presas, e cuidava dosdetalhes quando o programa ia entrar no ar. Ele era veiculado porduas rádios comunitárias locais e uma parceria com aCâmara dos Deputados garantia a distribuição paraqualquer emissora do Brasil, por meio da Rádio Câmara.Vitóriase encarregava da apresentação. Ex-operadora detelemarketing, aos 23 anos, está presa há um ano e meioe participava do programa desde que chegou na prisão.“Minhavida melhorou bastante. É até uma forma de a minhafamília ter mais contato comigo. Para as demais [detentas],também. Foi uma forma de melhorar a nossa auto-estima”,avalia.Maso programa Povo Marcado saiu do ar e, se vai voltar, ainda não se sabe.É que, em 14 de dezembro do ano passado, elas promoveram umarebelião que durou pouco mais de 12 horas. As transmissõesforam suspensas.Elaspediam a transferência de presas, que superlotavam o local.Idealizada para abrigar apenas 48 mulheres, a cadeia tinha cerca de215. Antes da rebelião, o secretário de Cultura domunicípio, Werinton Kermes, que idealizou e coordenava o programa, explicou a situação do presídiofeminino de Votorantim.“Éuma diferença muito grande no número da capacidade e ode presas que ela [a cadeia] abriga. Isso causa muitos problemas paraa cidade, por estar localizada no centro, e a gente, constantemente,assistia a rebeliões, queima de colchões, protestos defamiliares. A secretaria de Cultura de Votorantim começou apensar de que forma ela poderia incluir ações culturaispara que a vida dessas encarceradas pudesse se tornar algo pelo menossuportável”, contou.Asuperlotação sempre foi um problema por ali e oprograma, segundo osecretário de Cultura e as próprias presas, ajudavaa evitar conflitos e até mesmo rebeliões, que são pouco comunsentre as detentas. Suspensoe sem prazo para voltar ao ar, o programa Povo Marcado foi o canal para que aspresidiárias pudessem expressar a realidade interna daspenitenciárias femininas, a mesma constatada porlevantamentos do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD),detalhados pela coordenadora do núcleo fixo da instituição,Luciana Zafalon.“Hojenenhuma espécie de direito é assegurado de formahegemônica no sistema carcerário. No caso específicode visita íntima, para as mulheres, é um direito que étratado como liberalidade, o que é inadmissível. Agente [ainda] tem um déficit muito grande de vagas de trabalhoremunerado, e há que se esperar que o preso e a presa tenhamcondições de trabalhar”, cita.OPacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra asMulheres é um projeto da Secretaria Especial de Políticaspara as Mulheres (SPM), que articula entre os ministérios adistribuição de R$ 1 bilhão de reais a serem gastos entre 2008e 2011. Um dos pontos principais do pacto é a promoçãodos direitos humanos das mulheres em situação deprisão. Em reunião da Comissão Parlamentar deInquérito (CPI) do Sistema Carcerário em dezembro doano passado, a ministra da SPM, Nilcéa Freire explicou comodeve ser a distribuição da verba.“Eles[os recursos] serão investidos a partir da cooperaçãocom os governos estaduais. Cada governo que adere ao pacto formula umprojeto integral para o estado, de acordo com os governos municipais,e nós financiaremos”, disse a ministra, explicando que, paracada área contemplada pelo pacto, há uma formadiferente de repasses.